A Região Autónoma dos Açores vai a votos este domingo, numa eleição que promete ser uma das mais disputadas da história da autonomia. A campanha termina esta sexta-feira, e os partidos já começaram a fazer contas para os possíveis cenários pós-eleitorais.
Os principais protagonistas são os mesmos da última eleição de 2020, mas com papéis invertidos. Agora é o social-democrata José Manuel Bolieiro quem defende a liderança do Governo Regional dos Açores.
Já o socialista Vasco Cordeiro procura deixar o estatuto de líder da oposição para liderar o Executivo, cargo que foi seu entre 2012 e 2020.
O futuro da região está debaixo dos holofotes nacionais, face à proximidade das eleições para a Assembleia da República, motivando as visitas em catadupa dos líderes nacionais.
Preparámos-lhe um guia para perceber tudo o que está em jogo.
Como governava Bolieiro?
O PS venceu as eleições regionais em 2020, mas perdeu a maioria absoluta, obtendo 25 mandatos (de um total de 57), enquanto o PSD conseguiu 21, o CDS-PP três, o PPM, o BE e o Chega dois cada, enquanto IL e PAN se ficaram por um único deputado.
O social-democrata José Manuel Bolieiro conseguiu chegar à liderança do Governo Regional dos Açores, depois de ter firmado um acordo de governação entre PSD, CDS-PP e PPM e dois acordos de incidência parlamentar com IL e Chega.
Um acordo inédito e decisivo para que o PSD conseguisse a a maioria no Parlamento e assim recuperar o poder nos Açores após 24 anos de governação socialista.
Porque surgem eleições antecipadas?
Um primeiro percalço aconteceu em julho de 2021, quando o então líder do Chega, Carlos Furtado, passou a independente devido a divergências com André Ventura, mas manteve o apoio ao Governo açoriano.
O cenário de eleições antecipadas, as primeiras na história dos Açores, só começou a ganhar força em março do ano passado, após a IL ter denunciado o fim do acordo de incidência parlamentar.
Em novembro, o Plano e o Orçamento da Região foram chumbados com os votos contra de IL, PS e BE e as abstenções de Chega e PAN. Apenas a coligação de Governo (PSD/CDS-PP/PPM) e o deputado independente votaram a favor.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, reuniu o Conselho de Estado e anunciou depois a dissolução da Assembleia Legislativa Regional e a marcação de eleições antecipadas.
Como era constituída a Assembleia Regional?
Nas eleições de 2020, o PS ficou em primeiro com 40,6%, seguindo-se PSD (35%), CDS (5,7%), Chega (5,2%), BE (3,9%), PPM (2,4%), IL e PAN (2%). Ficou assim distribuído o parlamento mais plural da história da autonomia: PS com 25 deputados, PSD com 21, CDS com três, PPM com dois, BE com dois, Chega inicialmente com dois, PAN e IL com um parlamentar.
Foi a primeira vez que um Orçamento da Região foi chumbado?
Sim, o que motivou uma outra situação inédita: esta foi a primeira legislatura que foi interrompida antes do tempo nos Açores. Na região, apenas em duas legislaturas o Governo Regional não obteve a maioria dos deputados: em 1996, na primeira eleição de Carlos César, e agora em 2020, com José Manuel Bolieiro.
Qual é o histórico da governação no arquipélago?
As primeiras eleições para a Assembleia Legislativa dos Açores, disputadas em 1976 resultaram na vitória do PSD de Mota Amaral, que governou a região nas décadas seguintes, sempre com maioria absoluta.
Em 1996, já com Mota Amaral fora de cena, o PS alcançou a primeira vitória nas regionais com Carlos César. Seguiram-se 24 anos de poder do PS os Açores: de 1996 a 2012 com César, de 2012 a 2020 sob a liderança Vasco Cordeiro, atual líder socialista na região.
Como funciona o sistema eleitoral dos Açores?
Os equilíbrios entre as ilhas são essenciais para perceber a política açoriana. Nos Açores, existe um círculo eleitoral por cada uma das nove ilhas e mais um de compensação. Indo a contas: São Miguel elege 20 deputados, a Terceira 10; Pico e Faial quatro; São Jorge, Santa Maria, Graciosa e Flores três; e o Corvo dois.
Sobram cinco deputados que são eleitos pela compensação, uma particularidade do sistema açoriano, que aproveita os votos dispersos por vários círculos. A compensação contabiliza a totalidade dos mandatos e votos alcançados pelas forças políticas em todos os círculos e distribui cinco deputados de acordo com o método de Hondt.
Quantos partidos ou coligações concorrem às eleições de domingo?
O boletim de voto para as eleições legislativas açorianas conta com 11 forças políticas, três delas coligações.
A maioria apresentou candidatos aos 10 círculos: são os casos da coligação PSD/CDS/PPM, do PS, do BE, do PAN, do Chega, da CDU (coligação PCP/PEV), do Livre e do ADN.
Apresentam-se ainda a estas eleições a IL, que concorre em oito círculos; o JPP, que concorre em seis na sua estreia nas regionais açorianas; e a coligação Alternativa 21 (MPT/Aliança), que está na corrida em Santa Maria, depois de terem sido rejeitadas as suas listas aos restantes círculos eleitorais regionais.
O que dizem as sondagens?
São conhecidas duas sondagens sobre os possíveis resultados das eleições regionais de domingo: uma da Aximage para o Açoriano Oriental, Rádio Açores e TSF e outra da Universidade Católica para a RTP, Antena 1 e Público.
O estudo da Aximage prevê um empate técnico entre PSD/CDS-PP/PPM e o PS, com uma ligeira vantagem para a coligação (36,6% face a 33,5%), sem distribuição de mandatos.
Já a sondagem da Católica dá vitória ao PS com ligeira vantagem sobre o PSD (39% perante 36% da coligação), mas prevê um cenário em que o bloco dos partidos à direita se pode coligar e formar uma maioria absoluta.
Há novas coligações em cima da mesa?
Para já, o cenário ainda é incerto face à imprevisibilidade do desfecho final. À direita, no último dia de campanha, Bolieiro fez questão de frisar que “não faz parte do cenário” integrar o Chega no Governo.
Contudo, o líder do Chega/Açores já admitiu que pode exigir fazer parte do Governo e/ou reivindicar um Executivo apenas constituído por PSD e sem o CDS-PP e o PPM.
A IL também demonstrou abertura para voltar a viabilizar um Executivo regional da coligação, mas já veio alertar que, a acontecer, as negociações vão ser muito mais “musculadas” do que no passado.
O deputado independente ex-Chega que aprovou o último Orçamento concorre às eleições pelo Juntos Pelo Povo (uma força política de cariz regionalista que nasceu na Madeira) e já mostrou ambição de ser eleito para ser um “parceiro responsável”.
À esquerda, com a incerteza em torno da CDU (que atualmente não tem qualquer deputado) e do Livre (que nunca teve representação na região), o PS parece ter no BE o seu parceiro mais expectável, um cenário que não foi rejeitado por nenhum dos partidos.
Já o PAN poderá viabilizar um Governo tanto à esquerda como à direita, uma vez que chegou a aprovar o Plano e Orçamento da coligação PSD/CDS-PP/PPM para 2023.
Quais os principais temas em debate durante a campanha?
Ao longo da campanha marcada pela polarização, o PSD ensaiou um discurso muito centrado em Bolieiro, apostando na vitimização devido ao chumbo do Orçamento regional.
Os sociais-democratas procuraram colar o PS ao passado e fazer bandeira de medidas populares implementadas pelo atual Executivo – como a redução dos impostos até ao mínimo permitido por lei ou a Tarifa Açores, que assegura viagens aéreas a 60 euros para residentes.
O PS, por seu turno, além de associar o PSD à instabilidade, dramatizou o discurso nos últimos dias da campanha devido à possibilidade de o PSD renovar o apoio com o Chega, apelando ao voto útil daqueles que não querem um Governo Regional com a presença da extrema-direita.
Ao longo da campanha, o Chega apostou forte na presença de André Ventura nos Açores e admitiu querer fazer parte de “um Governo alternativo de direita”, prevendo consolidar-se como a terceira força política na Região.
Já os liberais tentaram demarcar-se da conotação de “causadores de instabilidade” por terem rasgado o acordo de incidência parlamentar com o Governo de coligação e votado contra o orçamento da Região, ao mesmo tempo que se mostraram disponíveis para um novo acordo, desde que, com “mais garantias”.
Também o recém-criado JPP se mostrou disponível para ser um “parceiro responsável”, enquanto o PAN admitiu querer ser um partido de oposição, mas dialogante com todos, menos com o Chega. Foco do partido tem sido a emergência climática, assim como o do Livre.
Por outro lado, partidos como o BE e a CDU centraram a campanha em questões sociais como a crise na habitação, os direitos dos trabalhadores e o aumento do custo de vida, com o BE a criticar fortemente as medidas da direita.
Fonte: Diário de Notícias / Portugal
Crédito da imagem: www.portal.azores.gov.pt