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O que pedem açorianos e madeirenses para a revisão constitucional? Partidos regionais, juízes no TC ​​​​​​​e presença no Conselho de Ministros

No contexto do processo de revisão constitucional em curso, fizemos as mesmas cinco perguntas aos líderes das duas Regiões Autónomas: aos sociais-democratas Miguel Albuquerque, presidente do Governo Regional da Madeira e José Manuel Bolieiro, presidente do Governo Regional dos Açores (bem como aos líderes dos PS regionais, neste momento na oposição).

Miguel Albuquerque

1 O que deve mudar de modo a que sejam reforçadas as autonomias regionais?
Em primeiro lugar, importa clarificar aspetos que foram alterados na revisão de 2004 e que, pese embora tenha sido anunciada como a “revisão das autonomias”, veio a mostrar-se um fracasso! A suposta clarificação das por demais reconhecidas “fronteiras indefinidas” na repartição das esferas de ação dos poderes regional e nacional veio a revelar-se um logro, porque não foi efetivamente feita. Os poderes autonómicos, onde se inclui um poder legislativo próprio, devem, de uma vez por todas, deixar de ser olhados pelo prisma de um “quase complexo” e temor separatista por parte do país atlântico que somos e passarem, isso sim, a serem vistos como uma oportunidade para que outras opções de governação, outras soluções mais criativas e inovadoras de desenvolvimento, possam ser ensaiadas. Um Portugal desenvolvido é um Portugal com bem-estar, qualidade de vida e respostas adequadas às necessidades e esperanças de quem nele vive. A diversidade de um país com território continental e território insular só se enriquece se soubermos coabitar bem com essa diferença e não com desconfiança. O que deve mudar em primeiro lugar é a forma como nos encaramos uns aos outros, como cidadãos do mesmo país. E uma revisão da Constituição assertiva pode ajudar muito nesse propósito.

2 O que não pode mesmo continuar tal como está?
O que não pode subsistir, 18 anos depois, é a forma restritiva como o Tribunal Constitucional continua a apreciar as matérias colocadas à sua consideração, quase fazendo crer que o “novo” modelo constitucional saído de 2004 é idêntico ao que vigorava até aí, com forte condicionalismo e com uma leitura invariavelmente restritora dos poderes autonómicos e dos seus graus de liberdade.

3 Quais são as propostas concretas?
Resumidamente destacaria: extinção do representante da República, gestão das zonas marítimas de cada Região Autónoma num quadro partilhado como Estado, competência dos Governos Regionais na execução da declaração do estado de emergência, alargamento dos poderes legislativos, os emigrantes votarem para as regionais, reforço da participação dos dirigentes regionais.

4 Que propostas o PSD nacional aceita incluir na sua proposta de revisão constitucional?
Em resultado do diálogo que tem existido no PSD, partido charneira na criação e defesa das autonomias regionais, as nossas propostas foram aceites e integram o documento apresentado.

5 Que entendimento existe entre o PSD Madeira e o dos Açores?
O entendimento de dois arquipélagos que, sendo diferentes, sabem bem o que são os constrangimentos colocados pela presente Constituição. Estamos perfeitamente alinhados na necessidade de possuir mais graus de liberdade para melhor responder aos legítimos anseios do mais de meio milhão de portugueses que vivem no Atlântico.

6 Acredita que o PS nacional está disponível para alargar as autonomias regionais?
Tenho essa esperança! Mesmo sendo uma realidade que a estrutura regional, o PS Madeira, não tenha aberto a boca sobre o tema, não tenha proposta para nada e não se atreva a dizer o que pensa sobre a revisão constitucional. Eu, como democrata e autonomista, tenho de acreditar que o PS nacional pensa mais longe e não quer ficar como o responsável por uma visão restritiva do futuro ansiado pelos madeirenses.

José Manuel Bolieiro

1 O que deve mudar de modo a que sejam reforçadas as autonomias regionais?
Todos os processos de revisão constitucional devem ser aproveitados para aperfeiçoar o regime autonómico dos Açores e da Madeira, como sucede com o processo de revisão constitucional já aberto e em curso. O PSD, como partido fundador da autonomia, assumiu o seu compromisso com os Açores e a Madeira, confirmando o seu papel liderante quanto à evolução das autonomias. No quadro constitucional, a valorização da descentralização e dos poderes legislativo e executivo dos seus órgãos de governo próprio são as principais referências do reforço das autonomias regionais.

2 O que não pode mesmo continuar tal como está?
As Regiões Autónomas não podem continuar a ser impedidas de terem uma palavra decisiva na gestão do seu próprio espaço marítimo. É imperativo clarificar, de uma vez por todas, os aspetos relacionados com a gestão partilhada dos recursos naturais, nomeadamente o mar. E essa clarificação urgente só pode ser alcançada já e com esta revisão constitucional.

3 Quais são as propostas concretas?
A extinção do representante da República, com transferência constitucional das respetivas competências para o Presidente da República; clarificação das competências regionais quanto à gestão das zonas marítimas de cada Região Autónoma, no quadro de uma gestão conjunta e partilhada; atribuição aos Estatutos Político-Administrativos dos Açores e da Madeira, de modo expresso, do estatuto de leis de valor reforçado; execução da declaração do estado de emergência assegurada nas Regiões Autónomas pelo Governo Regional; substituição da designação de decretos legislativos regionais por “leis regionais”; participação dos presidentes dos Governos Regionais em pelo menos duas reuniões anuais do Conselho de Ministros, para discussão de questões respeitantes às Regiões Autónomas; reforço da participação dos representantes das Regiões Autónomas no processo de construção europeia, nomeadamente quanto à pronúncia sobre questões e decisões que lhes digam respeito, e ao seu envolvimento nas instituições regionais e organismos do Estado na União Europeia, e ainda nas delegações nacionais envolvidas em processos de decisão europeia, e estabelecer a possibilidade de os emigrantes votarem nas eleições regionais quando estes tenham dupla residência – numa Região Autónoma e no estrangeiro.

4 Que propostas o PSD nacional aceita incluir na sua proposta de revisão constitucional?
As propostas acima enunciadas foram as que o PSD nacional incluiu no seu projeto.

5 Que entendimento existe entre o PSD Madeira e o dos Açores?
O PSD Açores e o PSD Madeira comungam, em traços gerais, dos mesmos objetivos em matéria de revisão constitucional, defendendo que esta deve ter como principais referências a clarificação dos poderes autonómicos e a extinção do representante da República.

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6 Acredita que o PS nacional está disponível para alargar as autonomias regionais?
É pertinente a abertura de um processo de diálogo com o PS para o aprofundamento da autonomia, tendo por base as propostas do PSD e de outros partidos que também apresentaram propostas nesta matéria. O PS Açores, como partido de alternativa política em ambas as Regiões Autónomas, tem agora a oportunidade de convencer o partido nacional a promover diálogo com o PSD.

SÉRGIO GONÇALVES (PS MADEIRA):

É preciso uma revisão constitucional “dedicada às autonomias”

O que pedem açorianos e madeirenses para a revisão constitucional? Partidos regionais, juízes no TC ​​​​​​​e
© Helder Santos/Global Imagens

O PS Madeira defende “a extinção do cargo do representante da República, o reforço das competências das Assembleias Legislativas Regionais, a necessidade de clarificação das competências das Regiões Autónomas na gestão do território marítimo, a participação dos presidentes dos Governos Regionais no Conselho de Ministros e a possibilidade de eleição de juízes para o Tribunal Constitucional indicados pelas Assembleias Legislativas”.
Estas propostas, que no entender de Sérgio Gonçalves reforçam “competências” e ajustam “questões que se revestem de enorme importância na relação das Regiões Autónomas com as restantes instituições do Estado”, ficam de fora da atual revisão porque “ficou concertado entre a direção nacional, com o PS Madeira e PS Açores, que ambas as estruturas regionais não apresentariam propostas neste processo”, porque falta concluir nas respetivas Assembleias Legislativas “o trabalho das comissões eventuais de aprofundamento da autonomia”.
“Na Madeira não foi sequer alvo de qualquer discussão, seja a revisão da Constituição seja do Estatuto Político-Administrativo, sendo que até ao momento foi apenas concluído o processo de revisão da Lei das Finanças das Regiões Autónomas”, sublinha. Só depois de concluídos todos os passos e “respeitando os órgãos próprios das Regiões” é que se deve “partir para uma revisão constitucional dedicada às autonomias”.
Por agora, a Comissão Política Nacional do PS definiu que a “proposta própria” do partido “não teria um âmbito muito alargado, sendo prioritário rever questões no âmbito dos direitos, liberdade e garantias”.

VASCO CORDEIRO (PS AÇORES):

Partidos regionais não podem ser proibidos

O que pedem açorianos e madeirenses para a revisão constitucional? Partidos regionais, juízes no TC ​​​​​​​e
© Sara Matos / Global Imagens

Os socialistas açorianos pretendem a “extinção da proibição de partidos regionais; extinção do cargo de representante da República, reatribuindo os seus poderes e competências aos órgãos regionais existentes; clarificação e consolidação da competência legislativa das Regiões Autónomas; eliminação da possibilidade de veto político na promulgação dos diplomas regionais; atribuição ao Parlamento dos Açores do poder de eleger o presidente do Governo Regional; participação do presidente do Governo nas reuniões do Conselho de Ministros; reforço dos poderes das Regiões Autónomas na gestão do mar; eleição pelas Assembleias Legislativas de dois juízes para o Tribunal Constitucional; criação de provedores setoriais regionais, e o estabelecimento do uso conjunto de símbolos regionais e da República nos respetivos territórios”.

Só depois de “concluídos com sucesso os trabalhos da Comissão Eventual para o Aprofundamento da Autonomia” – previstos para março de 2023 – e “consensualizadas no Parlamento dos Açores as alterações à Constituição que se revelarem necessárias, o PS Açores, através dos seus deputados eleitos à Assembleia da República, está disponível para, nos termos constitucionais, desencadear um processo de revisão da Constituição da República”.

Os socialistas, liderados por Vasco Cordeiro, entendem ser por isso necessário respeitar o entendimento da Assembleia Legislativa de que “os objetivos a alcançar só́ serão possíveis mediante um complexo e elevado trabalho de consensualização, técnica e política, em que o consenso porventura alcançado será́ o melhor argumento e mais uma vez prova da nossa maturidade democrática e autonómica”.

Fonte e crédito da imagem: Diário de Notícias / Portugal