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O amor capturado pela lente de Eduardo Gageiro

Nascimento, namoro, casamento. Estas são as palavras-chave da nova exposição do fotógrafo português Eduardo Gageiro, focada no amor. Depois do livro de fotografia centrado no mesmo tema, arrancou ontem a exposição na Biblioteca Orlando Ribeiro, e ficará patente até 17 de fevereiro com entrada gratuita.

O soneto Amor é fogo que arde sem se ver de Luís Vaz de Camões serviu de inspiração e mote para a nova exposição e 22º livro de Eduardo Gageiro. Entre as fotos a preto e branco, tal como no livro, encontram-se excertos de poemas sobre a temática do amor da autoria de Sophia de Mello Breyner, Florbela Espanca e Luís Vaz de Camões.

“Meti frases intercalares para serem lidas e a pessoa não folhear o livro. Procurei contar uma história sobre o amor. É um dos sentidos mais importantes do ser humano. Uma pessoa não pode viver sem amor”, referiu Eduardo Gageiro numa conversa com DN.

O livro que contém mais fotografias do que a exposição e já vendeu 800 exemplares na sua primeira edição. “Só quis fazer mil exemplares. E fiquei muito feliz porque as pessoas gostaram e compreenderam o livro”.

A exposição segue uma sequência, começando no nascimento, passando pela mãe “como a figura mais importante do ser humano “, namoros, casamento e, por fim, a esperança.

Dos 72 países por onde o fotógrafo já viajou, 18 estão presentes na exposição, tais como a Índia, o Iraque, Timor, Estados Unidos da América, Taiwan, Itália, Egito, China e Japão, entre outros.

“Livro do meu amor, do teu amor”, é o primeiro poema, de autoria de Florbela Espanca, que se pode ler na parede da biblioteca debaixo de uma fotografia tirada em Sacavém de uma senhora a espreitar para uma tenda com uma criança ao colo.

Entre as recentes e antigas fotografias, está a imagem da atriz portuguesa Eunice Muñoz com filhos em 1966 e outra que retrata o casamento de Eusébio e Flora em 1965.

O amor capturado pela lente de Eduardo Gageiro
© Gerardo Santos / Global Imagens

Mas Eduardo Gageiro, escolheu como destaque a fotografia tirada em Bagdad, no Iraque, de uma menina à porta de um hospital, durante o bloqueio americano em 1996. “É difícil eleger uma fotografia principalmente de uma pessoa que tem uma carreira tão longa. Mas esta aqui tirei à porta de um hospital em Bagdad. Foi numa altura em que não havia comida, por causa do bloqueio americano. Acho que os olhos dela dizem muito”.

Todas as imagens no livro e na exposição são a preto e branco. Para Eduardo Gageiro, as duas cores acabam por dar mais intensidade e destacam o conteúdo. “Durante anos fiz cor e perdi o entusiasmo”, acrescentou.

O amor capturado pela lente de Eduardo Gageiro
© Gerardo Santos / Global Imagens

Com a exposição, o fotógrafo português pretende mostrar aos visitantes que têm o direito de ser felizes. “Um grande amigo meu, que já faleceu, tinha uma frase que se encaixa bem aqui na exposição que é: “Façam o favor de serem felizes”. Acho que as pessoas têm o direito de serem felizes”, explicou.

Da fábrica de loiça ao fotojornalismo

Com 12 anos, trabalhava na Fábrica de Loiça de Sacavém. Andava entre pintores, escultores e operários com uma máquina fotográfica na mão que pertencia ao seu irmão. “Andava lá a tirar fotografias, enquanto fazia o meu trabalho que era fazer recados. Um dia, o escultor Armando Mesquita perguntou que fotografias andava a fazer e viu-as. Disse-me logo, “tu tens olho para a coisa mas não percebes nada disto”. Depois, convidou-me ao seu ateliê para me dar aulas de arte e composição”, relembra Gageiro.

Foi com a mesma idade que o fotógrafo fez capa do jornal Diário de Notícias. “Foi com uma fotografia tirada com a máquina do meu irmão. Terei a foto de um pastor e moleiro, enquanto estava de férias. Foi um bocado pirosa”.

Participou em vários concursos de fotografia que lhe deram nome e influência. “Os concursos tiveram muita influência porque começaram a ser publicadas notícias sobre os prémios que eu ganhava. Só depois é que consegui ir para os jornais”,explicou.

Foi em 1957, quando tinha 22 anos, que conseguiu lugar no Diário Ilustrado e começou a carreira em fotojornalismo. Trabalhou n” O Século Ilustrado, foi editor da revista Sábado, passou pela Associated Press e trabalhou também na Presidência da República.

Durante o Estado Novo, foi preso pela PIDE e passou dois meses na prisão de Caxias. “Alguns fotógrafos denunciaram-me. Passei muito tempo virado para a parede, naquela cela”. Acabou por ser libertado, devido à pressão de outros fotógrafos e jornalistas. “Tinha uma filha pequena e tinha medo de voltar a ser preso.”

Durante a sua carreira passou por vários países, um deles a Ucrânia. “Estive três vezes na União Soviética por prémios que ganhei. Esta guerra não faz sentido e choca-me muito”, confessa.

Desde 2014 que Eduardo Gageiro é o único português com uma fotografia em exposição permanente na Casa da História Europeia, em Bruxelas. Um retrato do 25 de Abril, a cores, com soldados com cravos e um deles a ler um jornal.

Aos 87 anos, Eduardo Gageiro pretende terminar com uma última exposição e livro. E já têm um nome escolhido – O último olhar. “Agora as doenças começam a surgir cada vez mais. Costumo dizer que estou cheio de peças. Se não fizer essa última exposição, fecho com esta. Ando sempre com a máquina fotográfica. É a minha paixão”.