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Miguel Albuquerque: “Consequências da ação do Presidente da República é ter as regiões com situações de instabilidade”

Em entrevista ao Jornal Económico, o presidente do Governo Regional da Madeira e cabeça-de-lista do PSD às eleições regionais deste domingo (26 de maio), Miguel Albuquerque, aborda o processo judicial de 24 de janeiro que levou ao derrube do Executivo madeirense de coligação PSD/CDS-PP.

Albuquerque aborda também o novo confronto que terá em eleições regionais com Paulo Cafôfo, e a decisão do Presidente da República, em dissolver a Assembleia da Madeira e convocar eleições antecipadas na Região Autónoma.

Acredita que o processo judicial poderá ter influência nos resultados eleitorais?

Não. Acho que não porque as pessoas já perceberam que estes processos são processos que derivam de denúncias anónimas com fins políticos. E que têm levado a consequências bastante negativas para a vida democrática. O que se passou em Lisboa com o primeiro-ministro, António Costa, o que se passou na Madeira, ou que se tem passado em todos estes processos é situações de criminalização da atividade política e depois muitas vezes de uma tentativa, através de denúncias anónimas, de se tentar obter dividendos políticos.

E isso as pessoas perceberam na Madeira. Perceberam no processo Influencer depois da decisão que foi tomada pelo juiz de instrução e perceberam no processo da Madeira depois da decisão tomada pelo juiz que foi muito clara onde toda aquela parafernália o que o juiz decidiu foi de que não havia qualquer indício de crime. Foi isso que ele escreveu, é preciso ter atenção porque esta situação é uma situação muito perigosa porque desestabiliza as instituições democráticas e quem ganha com isso é o populismo. Isto é uma autoestrada fantástica para o populismo.

A investigação do Ministério Público acabou por derrubar dois governos ….

Derrubam dois governos e derrubaram no Governo de António Costa ministros e secretários de Estado antes de António Costa se demitir. E muitos deles foram absolvidos em tribunal, incluindo o ministro da Defesa, e o secretário de Estado da Presidência. E tudo isto traz consequências negativas para a vida democrática.

Agora também há uma tendência para se meter providências cautelares para condicionar as decisões políticas. As decisões políticas são decisões políticas. E não se pode confundir nem criminalizar as decisões políticas em função de critérios que devem estar separados e que devem ser analisados do ponto de vista judicial. E depois há também a tendência para se confundir tudo no processo de averiguações.

E depois as fugas de informações para um conjunto de órgãos de comunicação social, a interação entre os órgãos de comunicação social e alguns meios de investigação, a ideia também de que uma averiguação é a mesma coisa que uma condenação, quando nem sequer há instrução.

Tudo isto traz uma insegurança jurídica para as instituições, para os cidadãos e traz consequências para o populismo, ou para estes populismos surfarem esta onda que não leva a sítio nenhum.

Mas no seu entender fazer-se investigações que até ao momento não levaram a sítio nenhum não deve levar a uma reflexão do campo político e judicial?

Essa reflexão tem de ser feita urgentemente. A provedora de Justiça falou disso. Tem de ser uma reflexão com serenidade e feita com seriedade. O que nós temos neste momento é um conjunto de forças políticas em Portugal que vivem disto do “Toda a gente é corrupta, É tudo corrupto”. Isto é no fundo ter um incêndio e tenta apagar o incêndio com petróleo.

E depois tem aqui um problema que é o dos direitos, liberdades e garantias, dos arguidos, das pessoas que estão sujeitas a isto. E depois isto tem outra consequência que é o afastamento de pessoas qualificadas para o exercício da política porque que ninguém está para se submeter mais tarde, e à família, a esta história de andar nos jornais onde se é condenado nos jornais, onde nada acontece, e depois fica com a sua vida devassada.

É preciso que a pessoa tenha alguma resistência psicológica. Eu cá aguento porque eu cá não me demito. Eu sei o que faço. E estou de perfeita consciência. Mas nem toda a gente aguenta isto. Isto é muito complicado do ponto de vista psicológico e até físico para as pessoas.

Chegamos a um ponto em que vê governantes a serem investigados, que acabam por se demitir. Já se começa a pedir demissões porque alguém é arguido. Como é que vê isso?

Isso é tudo um disparate porque o estatuto de arguido é um estatuto de defesa. Está numa averiguação. Qualquer pessoa pode ser investigada. Deve ser investigada com alguma cautela e algum recato. Mas isso nem tem nada a ver porque nem sequer há instrução do processo.

Não há formação de acusação, não há condenação, não há recursos. Não há nada. Portanto são investigações preliminares que levam a um hábito que era pavoroso. Alguém aparecia nos jornais desencadeava-se uma investigação porque era feita uma denúncia sem pés nem cabeça e o governante demitia-se.

Era uma forma ótima de metermos alguém a andar. Não se ganha as eleições nas urnas através da discussão dos méritos das políticas. Ganhava-se as discussões, e afastava-se governantes, a partir de denúncias anónimas. Muitas delas vieram no processo sem pés nem cabeça.

Mas a verdade é que governantes, e até governos têm caído, exatamente por esta questão de suspeita e de serem constituídos arguidos ….

Eu não concordo com isso porque acho que o estatuto de arguido não é um estatuto de condenação.

O PAN considerou que por ter estatuto de arguido não tinha condições para continuar ….

Foi isso que levou à minha demissão. Não foi por ser circunstância de ser arguido porque no dia que fui arguido disse que não me demitia.

Como viu a posição do PAN, ou se calhar metia as coisas de outra maneira, porque houve vários partidos a considerar que não tinha condições para estar no Governo Regional ….

Não tinha condições porquê? Não fui condenado em nada. Os meus direitos, liberdades, e garantias estão perfeitamente intocáveis. Eu estou apto para o exercício das minhas funções como qualquer pessoa pode estar. É muito fácil por cobardia se demitir. Eu acho que é uma coisa que ninguém deve fazer num Estado de direito.

Está a dizer que os partidos que disseram que não tinha condições para governar precipitaram-se?

Quem disse que não tinha condições foi a líder do PAN.

Houve mais partidos por exemplo PS, Iniciativa Liberal e o resto da oposição ….

Mas o PS não estava a sustentar o Governo.

Estaria disponível para se entender com o PAN depois da tomada de posição que tiveram?

Nós estamos num cenário pré-eleitoral. Num cenário pré-eleitoral não se faz nenhum cenário só depois de ter os resultados das eleições.

Tivemos casos em Portugal de pessoas que se aguentaram. Por exemplo Rui Moreira foi arguido num processo depois foi absolvido e continuou as suas funções de presidente de Câmara [do Porto].

Temos de olhar para o processo. O que se passa? É preciso nos lembrarmos que os empresários e o presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado, foram ouvidos durante 22 dias sem que soubesse alguma decisão. Estava tudo na expetativa do que ia acontecer. E ao fim de 22 dias o que o juiz disse foi que não havia qualquer crime e muito menos qualquer crime grave.

Aliás como aconteceu em Lisboa.

Deita um presidente da Câmara abaixo, o presidente da Câmara saiu. Agora tem outros casos. Tem o presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira. Mudaram a presidência do Benfica e até hoje não sabe o que se passou.

O Correio da Manhã noticiou que supostamente a RIM beneficiou com a construção da sua casa em São Vicente. Esta casa já tem estado envolvida em várias polémicas. Como tem visto isto?

É um absurdo. A minha vida pessoal é toda transparente. As pessoas que não sabem como funciona a vida pública colocam essa questão. A RIM é uma empresa que tem crescido e vai aos concursos do Governo como as outras empresas. São concurso públicos, são fiscalizados, são auditados pelo Tribunal de Contas.

E essa empresa tem crescido como a maioria das empresas de construção da Madeira. Nada tem a ver uma coisa com a outra. Não tem beneficiado de nada. O que a empresa faz é tem ganho alguns concursos públicos como as outras ganham. E tem os seus trabalhos com as outras têm. A minha vida está toda direita. Os trabalhos que eles fazem eu paguei. Está tudo pago. Está tudo escrutinado. Se quiserem ver vão lá ver. É tudo público.

Está a fazer-se notícias do nada sem qualquer tipo de justificação?

Por exemplo fui fazer uma viagem oficial onde tem milhares de madeirenses, há 20 anos que não ia nenhum presidente do Governo lá, Curaçau, temos madeirenses, tem bancos, a diretora do hospital é madeirense, tem uma carga de empresários lá, fomos lá fazer uma visita, tem o cônsul que foi nomeado agora, que é o Joel, vamos lá e então é viagem de luxo às Caraíbas.

Em 2024 volta a enfrentar Paulo Cafôfo em eleições regionais, reeditando o confronto de 2019. Como é que vê este novo confronto?

Não vejo nada de especial.

Na altura foram umas eleições disputadas ….

Mas ganhei. Toda a gente dizia que ia perder e ganhei. Agora dizem que vai ser difícil pode ser que eu ganhe.

Acredita que o PS possa sair mais forte agora com Cafôfo?

Nas últimas eleições perderam por 20 mil votos. Não sei se foram assim tão boas as nacionais. Vamos ver.

Que mensagem quer deixar para o eleitorado?

É fundamental o PSD continuar a governar a Madeira. Toda a gente sabe o que fizemos, o que vamos fazer. Connosco os madeirenses podem contar para continuarmos a fazer o desenvolvimento integral da Região em todas as áreas. Nós temos os melhores quadros. Temos um Governo apto e com obra feita. E temos de dar continuidade ao programa e ao Governo que tinha sido eleito ainda há sete meses.

Diria que este seria o seu último mandato, pelo menos nas últimas eleições admitia essa possibilidade …

Seria o último mandato mas temos de levar em linha de conta as circunstâncias políticas em que tudo isso se passou. Este era o meu último mandato. Tinha dito que ia fazer três mandatos. Vamos ver agora.

O seu futuro fica em aberto ….

Já tinha dado a entender que o meu terceiro mandato era o meu último mandato. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, resolveu deitar isto tudo abaixo. Está resolvido. Vamos a eleições.

Concorda com este derrube? Concorda com a dissolução?

Tínhamos sido eleitos há menos de seis meses.

Não havia nenhuma alteração de circunstâncias. E ademais a vitória da coligação PSD/CDS-PP tinha sido clara. Ganhamos em 52 das 54 das freguesias e nos 11 concelhos. E essa ideia de comparar com que se passou a nível nacional porque o candidato a presidente do Governo era o mesmo no meu caso, o que já não acontecia com António Costa.

O que eu defendi na altura perante o Presidente da República essa era a posição do PSD, do CDS-PP. Era dar posse ao Governo e o Governo continuar a governar. Todo este atraso. Temos o Orçamento para aprovar, temos o programa de Governo. Isso foi o que defendemos [perante o Presidente da República]. Mas o Presidente da República entendeu fazer a dissolução. Vamos a eleições. Ninguém tem medo de ir para eleições.

Ou seja, defende aquela linha de que deveria ser a Assembleia Legislativa da Madeira a determinar se o Governo deveria cair ou não ….

O que eu defendi era que tínhamos condições [para continuar a governar]. A legitimidade no fundo não estava muito alterada. Porquê? Tínhamos sido eleitos há seis meses, o presidente do Governo era o mesmo, a maioria era a mesma, e depois essa maioria tinha sido confirmada nas eleições nacionais quando tivemos mais dois mil votos face às eleições anteriores.

Se houvesse uma quebra de confiança, tínhamos perdido as eleições nacionais. A reconfiguração do quadro político em termos de confiança dos eleitores mantinha-se. Esse era o nosso entendimento. Mas o Presidente da República entendeu que era preciso renovar a legitimidade.

Colocava a pergunta também no sentido de que as Regiões Autónomas têm um sistema parlamentar completamente diferente daquele que existe a nível nacional ….

Está bem. Mas a verdade é que neste momento temos uma situação de um governo minoritário nos Açores, que é uma situação de instabilidade, tem uma situação de instabilidade no país, e não convém criar aqui uma situação de instabilidade. As consequências da ação do Presidente da República é no fundo ter as regiões todas do país com situações de instabilidade.

No caso dos Açores a Assembleia Regional acabou dissolvida devido ao chumbo do Orçamento ….

Exatamente. Mas continua a ter um Governo minoritário. E a nível nacional não é fácil governar, como as pessoas estão a ver, com um Governo minoritário. Os Governos minoritários são muito condicionados, estão muito condicionados na ação, na celeridade das decisões, e naquilo que é preciso que é governar no interesse da população.

Governar não é conversa fiada. Governar não é retórica. Governar é tomar decisões e ter ação, ação concreta. Este “batua” político não traz consequências nenhumas. Estamos a perder imenso tempo. Não consegue decidir. Muitas vezes não consegue decidir aquilo que é elementar e que é preciso decidir. Veja o que acontece com os hospitais no Continente. O nosso já começou e eles ainda estão a discutir.

A história do aeroporto. Estão há 50 anos para decidir um aeroporto. E depois tudo isto traz consequências porque as pessoas não sentem que haja ação. Quem é que ganha com isso? São sempre os mesmos. São as forças radicais. Você vai polarizando a sociedade.

Do seu ponto de vista o Presidente da República deveria deixar os parlamentos regionais funcionarem, ou seja serem os parlamentos a decidir se os Governos se mantém-se em funções ou não, consoante obviamente o suporte parlamentar que têm?

Tiveram que passar os seis meses para o Presidente da República tomar uma medida. Ele aguardou os seis meses para dizer que ia dissolver a Assembleia Regional. Se foi uma boa decisão? Eu acho que não foi.

Mas aqui a questão é que tendo em conta o sistema que existe na Madeira, ou seja, as Assembleia Regionais têm a capacidade de legitimar, ou não, os Governo Regionais, não é necessário digamos a intervenção do Presidente da República ….

Neste caso como o Representante da República da Madeira, Ireneu Barreto, tinha decido que era o Presidente da República que ia decidir foi isso que ficou decidido por isso mesmo é que não houve nenhuma solução intermédia.

Fonte: O Jornal Económico / Portugal

Crédito da imagem: Homem de Gouveia – Lusa (arquivo)