O Tribunal Constitucional (TC) voltou a decretar a inconstitucionalidade de algumas normas do diploma que despenaliza a morte medicamente assistida.
A decisão anunciada esta segunda-feira e que resulta de um pedido de fiscalização preventiva do Presidente da República, foi aprovada por uma maioria de sete juízes contra seis. E, tal como já acontecera na primeira versão do diploma, a declaração de inconstitucionalidade funda-se na falta de clareza e densificação dos conceitos usados no texto.
Nas palavras do presidente do TC, João Caupers, a nova versão padece de uma “intolerável indefinição” quanto ao exato âmbito de aplicação da lei.
Lembrando que o TC já se pronunciou sobre o diploma, o juiz conselheiro referiu que o tribunal tinha a expectativa de que a nova versão fosse ao encontro das questões então apontadas pelo Constitucional. Mas “o legislador, tendo embora desenvolvido esforços no sentido da densificação e da clarificação de alguns conceitos utilizados na versão anteriormente fiscalizada, optou por ir mais além, alterando em aspetos essenciais” o texto anterior.
Ao fazê-lo, acrescentou João Caupers, a Assembleia da República “limitou-se a exercer as competências que a Constituição lhe atribui”, mas “tal opção teve consequências”.
O juíz conselheiro apontou ao conceito de sofrimento, tipificado no diploma “através da enumeração de três características, físico, psicológico e espiritual, ligados pela conjunção “e””, sustentando que “são plausíveis e sustentáveis duas interpretações antagónicas deste preceito”.
Com isto o legislador “fez nascer a dúvida, que lhe cabe clarificar, sobre se a exigência é cumulativa ou alternativa”, sublinhou João Caupers.
Ou seja, o texto permite duas possibilidades interpretativas, ambas “plausíveis”, mas que conduzem “resultados práticos antagónicos” – “reservar a morte medicamente assistida a pessoas que em virtude de lesão definitiva de gravidade extrema ou doença grave e incurável relatem um sofrimento de grande intensidade que responda cumulativamente às tipologias do sofrimento” ou admitir a morte medicamente assistida nas situações enunciadas, mas apenas perante alguma das três tipificações de sofrimento.
Na sequência da declaração de inconstitucionalidade, Marcelo Rebelo de Sousa já anunciou, no site da Presidência da República, que vai devolver o texto à Assembleia da República sem promulgação.
Esta foi a segunda vez que os juízes conselheiros se pronunciaram sobre o texto que despenaliza a morte medicamente assistida. Em fevereiro de 2021, quando o diploma chegou pela primeira vez a Belém, Marcelo Rebelo de Sousa pediu a apreciação da constitucionalidade de vários pontos do articulado, com o Tribunal Constitucional a determinar, por maioria, que o diploma não estava conforme à Constituição.
A morte medicamente assistida voltou então à Assembleia da República e, após alterações ao texto para expurgar as inconstitucionalidades, o diploma foi novamente reenviado para promulgação do Presidente da República em novembro de 2021.
Uma segunda versão que também não passou pelo crivo de Belém, com Marcelo Rebelo de Sousa a invocar a falta de precisão dos conceitos usados no texto para vetar politicamente o diploma.
Uma terceira versão do diploma chegou ao Presidente da República no início deste ano. Marcelo optou por enviar novamente o diploma para o TC, considerando que o texto mantém “indefinição conceptual” nos conceitos legais, e que “a certeza e a segurança jurídica são essenciais no domínio central dos direitos, liberdades e garantias”.
Fonte: Diário de Notícias / Portugal
Legenda da imagem: João Caupers, presidente do Tribunal Constitucional.
Crédito da imagem: Manuel de Almeida / LUSA