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Governo fecha pacote da habitação e remete mudanças para o Parlamento

O Governo aprova hoje, em Conselho de Ministros, o conjunto de medidas previstas no programa “Mais Habitação”, que visa combater a escassez na oferta de habitação a preços comportáveis.

Em cima da mesa estão algumas das propostas mais polémicas do plano, caso do arrendamento forçado de casas devolutas, do teto ao aumento de novas rendas, e do fim de novas licenças de alojamento local, um setor que sofrerá também um agravamento fiscal em zonas de maior pressão urbanística.

Medidas que têm merecido forte contestação e já foram visadas pelo Presidente da República que, nas últimas semanas, subiu o tom das críticas, sobretudo à possibilidade de arrendamento coercivo de casas devolutas. 

Marcelo Rebelo de Sousa já levantou dúvidas de constitucionalidade, já disse que a medida deve ser “repensada” e admitiu não a promulgar. A questão está agora em saber se o Executivo – que garantiu que levará em conta os contributos feitos no âmbito da consulta pública do diploma, e também o do Presidente da República – recuará.

A SIC Notícias avançava ontem que o Governo manterá todas as medidas. Mas expectavelmente com ajustes e, como referiu ao DN fonte da bancada socialista, com “margem de manobra para alterações no trabalho na especialidade”, em sede parlamentar, onde os socialistas tentarão incorporar algumas contribuições dos projetos do PSD.

O líder da bancada socialista, Eurico Brilhante Dias, tem insistido na abertura ao diálogo da maioria absoluta socialista, nesta matéria em específico, apontando como exemplo disso mesmo a viabilização (pela abstenção) de várias propostas da oposição, há cerca de duas semanas.

Na terça-feira, no encerramento das Jornadas Parlamentares do PS, o próprio primeiro-ministro garantiu “espírito de abertura”. “Não apenas em torno das nossas iniciativas, mas também das iniciativas dos partidos da oposição”, disse então António Costa, sublinhando que nas matérias que são competência parlamentar “tudo o que houver a mudar mudará por via do debate e da aprovação que se fará na Assembleia da República”.

Promover o arrendamento acessível

O arrendamento coercivo de casas devolutas prevê a possibilidade de o Estado arrendar as casas, a troco do pagamento de uma renda ao proprietário. Para evitar este cenário, o proprietário terá um prazo de 100 dias para pôr a casa a uso antes de esta ser sujeita a arrendamento forçado. Fora desta equação ficam os fogos que estão vazios por se tratarem de casas de férias ou de emigrantes, quando o proprietário esteja num lar ou a prestar cuidados permanentes como cuidador informal, ou quando os donos estejam deslocados por razões profissionais, de saúde ou formativas.

Outra proposta que tem estado no centro da polémica é a limitação à subida das rendas nos novos contratos – se se tratar de casas que estiveram no mercado de arrendamento nos últimos cinco anos o aumento não poderá ser superior a 2% (valor a que podem ser somados os coeficientes de atualização automática dos três anos anteriores bem como o nível da inflação).

Uma das grandes linhas de aposta do programa desenhado pelo Governo passa pela criação de incentivos, sob diversas formas, ao arrendamento acessível. 

Para isso, o Executivo tenta apostar no aumento do parque habitacional do Estado, nomeadamente dando isenção de IRS às mais valias obtidas com a venda de imóveis ao Estado ou aos municípios. Com igual propósito, outra das medidas que avançará hoje prevê que o Estado arrende casas aos privados para depois as subarrendar a valores acessíveis, com uma taxa de esforço máxima de 35% para o inquilino.

Por outro lado, e com o objetivo de dar maior confiança aos proprietários, o plano “Mais Habitação” prevê também que o Estado se substitua ao inquilino no pagamento de rendas, após três meses de incumprimento – caberá depois aos serviços públicos apurar as razões da falta de pagamento, mobilizar os meios da Segurança Social se houver necessidade de apoio, ou avançar para a cobrança da dívida.

Outra medida que visa aumentar o número de casas disponíveis no mercado passa pela criação de incentivos para que casas atualmente afetas ao alojamento local transitem para o arrendamento tradicional, beneficiando assim de isenção no IRS sobre as rendas até ao final de 2030.

Medidas “absolutamente desproporcionais”

Esta é a única medida, das várias com incidência no alojamento local, que não tem merecido protestos do setor. Mas, ainda assim, Eduardo Miranda, presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP), não deixa de falar em “chantagem”, dado que este é um “incentivo que vem agarrado a uma penalização gravíssima” – a contribuição extraordinária que incidirá sobre imóveis localizados em zona de pressão urbanística, que resultará da aplicação de um coeficiente com vários indicadores, sendo que a a taxa aplicável à base tributável é de 35%.

Eduardo Miranda diz que nas várias simulações já feitas “há casos em que a contribuição fica acima da faturação” – “É inacreditável”.

Nas últimas semanas, além dos vários protestos feitos pelo setor em Lisboa, no Porto e no Algarve – e que se voltam a repetir hoje – , a ALEP reuniu com a tutela (a Economia), a ministra da Habitação e vários grupos parlamentares, na tentativa de reverter esta medida, assim como a possibilidade de mais de metade um condomínio poder cancelar o alojamento local numa fração de um prédio. Uma proposta que “vai criar um ambiente de conflitualidade” entre condóminos, argumenta Eduardo Miranda.

Na mira do setor está também a suspensão de novas licenças de alojamento local (com exceção de zonas do interior) e a caducidade dos atuais registos em 2030, data após a qual as licenças são renovadas de cinco em cinco anos. “Estas medidas vão não só matar o alojamento local, mas também as economias locais e não vão trazer nada de novo à habitação”, diz o líder da ALEP, sustentando que há 55 mil famílias que vivem do alojamento local e milhares de pessoas que trabalham para este setor. 

“Não nos deram nenhum tipo de expectativa, mas queremos acreditar que algumas destas medidas serão revistas”, diz Eduardo Miranda, falando num conjunto de propostas “absolutamente desproporcionais”.

Fonte: Diário de Notícias / Portugal

Crédito da imagem: Paulo Sprangler / Global Imagens