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Dez audições depois, somam-se pontas soltas e dúvidas sobre o caso das gémeas

Passaram 67 dias desde que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) ao caso das gémeas luso-brasileiras tratadas com o medicamento mais caro do mundo iniciou os trabalhos.

Desde então, foram ouvidas 10 pessoas com ligação ao caso, incluindo ex-governantes, a mãe das meninas e funcionários da Casa Civil da Presidência da República.

Mas, terminada esta primeira ronda de audições, persistem as dúvidas sobre eventuais cunhas ou favorecimentos no acesso ao tratamento para a atrofia medular espinal (doença de que as duas gémeas sofrem).

O que se pode retirar até aqui? A Presidência – e, por arrasto, Marcelo Rebelo de Sousa – terá tido um papel de mero remetente de correspondência entre o Brasil e o Gabinete do primeiro-ministro, que, por sua vez, mais não terá feito do que um “procedimento habitual”: enviar os e-mails vindos de Belém (e de cidadãos) para o respetivo Ministério.

Esta defesa de um tratamento normal, igual a tantos outros casos de correspondência entre a Presidência e o Governo, é uma imagem que fica das audições a Fernando Frutuoso de Melo (chefe da Casa Civil), Maria João Ruela (assessora para os Assuntos Sociais) e Francisco André (ex-chefe de Gabinete de António Costa).

Todos, sem exceção, rejeitaram a ideia de um tratamento preferencial nesta situação após o envio de e-mails de Nuno Rebelo de Sousa, filho de Marcelo, a pedir ajuda para as duas meninas.

Na audiência a Francisco André houve, até, deputados a considerar que ouvir o ex-chefe de Gabinete de António Costa era desnecessário e caía no “domínio do inútil” devido à intervenção que teve no caso.

Por outro lado, a audição a Daniela Martins, a mãe das gémeas, deixou várias “pontas soltas”, perguntas sem resposta e várias dúvidas no ar: quem garantiu o acesso às consultas; se houve ou não intervenção de Lacerda Sales; entre outras. A audição a Wilson Bicalho, advogado da mãe, foi também polémica.

Recusando-se a responder por invocar sigilo profissional, não respondeu a perguntas dos deputados e a audição acabou por ser suspensa.

Em cima da mesa esteve também avançar com processos contra Daniela Martins e o advogado, por não terem fornecido documentos relacionados com o seguro de saúde das gémeas. No entanto, “diligências pessoais” do deputado António Rodrigues (PSD) acabaram por fornecê-los aos deputados.

O próprio Nuno Rebelo de Sousa foi ouvido na CPI. Mas, tendo estatuto de arguido devido a este caso, o filho de Marcelo Rebelo de Sousa remeteu-se ao silêncio a toda e qualquer questão feita pelos deputados, de modo a não dizer nada que o pudesse prejudicar.

O Chega – que utilizou um direito potestativo para que fosse constituída a CPI e terá direito a compor o relatório das conclusões – parece discordar desta linha de pensamento e insistiu em pedir documentos e trocas de correspondência.

Neste sentido, há quem acuse o Chega de querer “instrumentalizar” e usar a CPI para “partidarização”, sobretudo por ter requerido as audições de Lacerda Sales (ex-secretário de Estado da Saúde) e António Costa (ex-primeiro-ministro) durante a campanha eleitoral para as Eleições Europeias e a discussão para os cargos de topo da União Europeia.

Esta atitude mais interventiva e de procurar imputar ligações a Marcelo estendeu-se, aliás, para lá da CPI, com Cristina Rodrigues, deputada do Chega, a questionar no Facebook por que motivo o Presidente da República cortou ligações com Nuno Rebelo de Sousa “se correu tudo dentro da normalidade” neste caso.

António Costa vai responder por escrito aos deputados

Com mais de 40 audições em vista para o regresso aos trabalhos, em setembro, há já momentos que se preveem que possam vir a causar polémica. Desde logo porque António Costa vai responder aos deputados.

Fá-lo-á por escrito e cada partido terá direito a colocar dez perguntas, que têm de ser enviadas a Rui Paulo Sousa, presidente da CPI, até 6 de setembro. Quando as receber, o ex-primeiro-ministro terá 10 dias para responder.

À entrada para a última audição – que aconteceu na quinta-feira – os deputados aprovaram ainda a data para ouvir a ex-ministra da Saúde e atual eurodeputada, Marta Temido, que prestará esclarecimentos a 27 de setembro (neste caso, terá de o fazer por videoconferência ou presencialmente).

A próxima semana será também decisiva para perceber o que fará o próprio Presidente da República, que remeteu uma decisão para os próximos dias. Se o quiser fazer, Marcelo Rebelo de Sousa pode, também ele, responder por escrito.

Já o ex-presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, confirmou que vai depor na comissão parlamentar de inquérito ao caso das gémeas presencialmente, rejeitando a prerrogativa de responder por escrito.

Quem já foi ouvido

António Lacerda Sales
Ex-secretário de Estado da Saúde (17/6/2024)

Daniela Martins
Mãe das gémeas (21/6/2024)

Catarina Sarmento e Castro
Ex-ministra da Justiça (25/6/2024)

Wilson Bicalho*
Advogado de Daniela Martins (28/6/2024)

Nuno Rebelo de Sousa
Filho do Presidente da República (3/7/2024)

Filomena Rosa
Presidente do Instituto dos Registos e Notariado (10/7/2024)

Berta Nunes
Ex-secretária de Estado das Comunidades Portuguesas (19/7/2024)

Fernando Frutuoso de Melo
Chefe da Casa Civil ddo Presidente da República (23/7/2024)

Maria João Ruela
Assessora da Casa Civil para os Assuntos Sociais e Comunidades (24/7/2024)

Francisco André
Ex-chefe de gabinete de António Costa (25/7/2024)

*Após invocar sigilo profissional para não responder às perguntas, a audição foi suspensa.

Fonte: Diário de Notícias / Portugal

Crédito da imagem: Gerardo Santos / Global Imagens