Pedro Sánchez anunciou esta segunda-feira que não vai demitir-se do cargo de primeiro-ministro espanhol. “Decidi continuar”, declarou no Palácio da Moncloa, a sede do Governo de Espanha.
A decisão acontece depois de Sánchez anunciar na quarta-feira que iria refletir sobre se valia a pena continuar à frente do governo espanhol, após um tribunal ter aberto uma investigação contra a sua mulher, Begoña Gómez, por alegado tráfico de influências e corrupção.
“Exigir resistência incondicional é colocar o foco nas vítimas e não nos agressores. Esta campanha de difamação não vai parar. Nós podemos enfrentá-la”, disse Sánchez, que aproveitou para agradecer “as manifestações de solidariedade recebidas de todos os lados”.
“Assumo a decisão de continuar, se possível ainda com mais força. Não se trata do destino de um determinado líder. Trata-se de decidir que tipo de sociedade queremos ser. O nosso país precisa desta reflexão. Durante demasiado tempo deixámos que a lama contaminasse a nossa vida pública”, considerou Pedro Sánchez.
Defendeu que não se pode permitir que “as mentiras mais grosseiras substituam o debate com respeito baseado em evidências”. “Ou dizemos ‘basta’ ou esta degradação da vida pública vai determinar o nosso futuro condenando-nos como país”, afirmou.
O líder do Governo espanhol sublinhou que não está em causa “o legítimo debate sobre opções políticas”, mas “as regras do jogo”. “Se consentirmos que os boatos deliberados dirijam o debate político isso causará um dano irreparável à democracia”, afirmou.
“Assumo o meu compromisso de trabalhar sem descanso, com firmeza e com serenidade pela regeneração pendente da nossa democracia e pelo avanço e consolidação de direitos e liberdades”, acrescentou.
Na declaração que fez ao país, o primeiro-ministro aproveitou para fazer um pedido: “Apelo à sociedade espanhola para que volte a dar o exemplo. Os males que nos afligem fazem parte de um movimento global. Mostremos ao mundo como se defende a democracia”.
Em causa está uma denúncia de um coletivo ligado à extrema-direita, o Manos Limpias, sob suspeitas de tráfico de influências e corrupção empresarial pelas ligações à Air Europa. O primeiro-ministro nega que a mulher tenha cometido qualquer crime, acusando a direita e a extrema-direita de um “ataque sem precedentes” para o destruir pessoal e politicamente.
Sánchez falou com os seus ministros na quarta-feira, mas depois fechou-se na Moncloa com a família – tendo tido contactos esporádicos com líderes internacionais, como o presidente brasileiro, Lula da Silva, que lhe telefonou a dar o seu apoio. Sem contacto direto com o líder, os socialistas multiplicaram-se em ações de solidariedade para com o primeiro-ministro, pedindo-lhe que fique no cargo.
O Ministério Público pediu no dia seguinte o arquivamento da queixa, por considerar não haver indícios de delito que justifiquem a abertura de um procedimento penal.
O líder do Partido Socialista espanhol (PSOE) e do Governo de Madrid disse que ele próprio e a mulher, Begoña Gómez, estão há meses a ser vítimas da “máquina de lodo” da direita e da extrema-direita (Partido Popular e Vox) e que não sabia se valia a pena continuar à frente dos cargos perante um “ataque sem precedentes, tão grave e tão grosseiro”.
“Muitas vezes esquecemo-nos de que por trás dos políticos há pessoas”, afirmou, num texto publicado na rede social X.
Sánchez admitiu que o texto que publicou na quarta-feira na rede social X, em que assumiu que ponderava demitir-se, causou desconcerto e garantiu que “não obedeceu a nenhum cálculo político”.
“Precisava de parar e refletir sobre tudo isto”, afirmou, reconhecendo que se moveu por “motivos pessoais” e que expôs publicamente “sentimentos que em política não costumam ser admissíveis” num texto em que disse que muitas vezes se esquece que atrás de um político está uma pessoa e que é um homem “profundamente apaixonado” pela mulher, um alvo de ataques pessoais permanente.
“Dói viver esta situação e não a desejo a ninguém”, afirmou esta segunda-feira.
No caso que envolve Begoña Gómez estão em causa ligações da mulher de Pedro Sánchez a empresas privadas, como a companhia aérea Air Europa, que receberam apoios públicos durante a crise da pandemia de covid-19 ou assinaram contratos com o Estado quando o marido era já primeiro-ministro.
Sánchez, que está à frente do Governo espanhol desde 2018, tem também sido atacado por causa de uma investigação judicial a um assessor de um ex-ministro socialista que alegadamente cobrou comissões ilegais a vender máscaras durante a pandemia a entidades públicas, incluindo governos regionais então nas mãos do PSOE.
Este caso levou à criação de comissões de inquérito no parlamento, apoiadas pelos socialistas, sobre a compra de material sanitário pelas administrações públicas durante a crise da covid-19. Os trabalhos destas comissões arrancaram na semana passada.
Fonte: Diário de Notícias / Portugal
Crédito da imagem: Riccardo Antimani / EPA