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Caso gémeas luso-brasileiras. Nuno Rebelo de Sousa invocou direito ao silêncio

O filho do Presidente da República, Nuno Rebelo de Sousa, foi esta quarta-feira ouvido, através de videoconferência, na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o caso das gémeas luso-brasileiras tratadas no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.

Nuno Rebelo de Sousa respondeu a quase todas as perguntas com a recomendação que alegou ter sido dada pelos advogados: “Pelas razões referidas, não respondo a essa questão”.

“Não existe relação entre o direito ao silêncio e o segredo”, justificou o filho de Marcelo Rebelo de Sousa perante a CPI, na sua declaração inicial, aludindo ao parecer dos seus advogados.

“Não respondo”. Foi esta a formulação que Nuno Rebelo de Sousa prometeu utilizar como resposta a cada pergunta que lhe for dirigida.

A deputada da IL Joana Cordeiro iniciou a primeira ronda de perguntas ao depoente. A liberal evocou “contradições” e questionou o filho de Marcelo Rebelo de Sousa sobre uma reunião com o ex-secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales.

A pergunta estendeu-se depois à secretária do antigo governante, Carla Silva, que terá escrito uma carta a Santa Maria a pedir a consulta para dar início ao tratamento das crianças. Nuno Rebelo de Sousa continuou em silêncio.

Perante a resposta reiterada de Nuno Rebelo de Sousa, a deputada Joana Cordeiro acusa o filho de Marcelo de “cobardia” e lembra a condenação pública que o Presidente da República fez em relação ao filho.

A deputada do BE Joana Mortágua continuou a audição e começou por perguntar a Nuno Rebelo de Sousa se estaria disposto a responder a perguntas sobre a sua atividade na Câmara de Comércio de São Paulo.

“Não respondo” foi a resposta reiterada pelo filho do Chefe de Estado.

“Nuno Rebelo de Sousa terá apontado não conhecer a mãe” das gémeas, continua Joana Mortágua, optando por confrontar o depoente com contradições em vez de fazer perguntas, face à mesma reposta dada.

“Em que que aspetos é que, falando, se incriminaria”, pergunta, por fim, Joana Mortágua, obtendo do depoente a mesma resposta: “Não respondo”.

O PCP inicia o seu momento de perguntas ao filho de Marcelo, com o deputado Alfredo Maia. O deputado comunista questionou Nuno Rebelo de Sousa sobre o preço dos medicamentos, que terão custado 4 milhões de euros para as duas crianças, mas obteve a mesma resposta dada antes.

Com o silêncio de Nuno Rebelo de Sousa, Alfredo Maia prescindiu de fazer mais perguntas.

Paulo Muacho, do Livre, também prescinde de fazer perguntas a Nuno Rebelo de Sousa, dizendo compreender o “direito constitucional” evocado pelo deponte, apesar de condenar o seu silêncio.

CDS acusa Nuno Rebelo de Sousa de “desobediência”

Pelo grupo parlamentar do CDS, João Almeida lembrou que não pediu a audição de Nuno Rebelo de Sousa, mas fez uma pergunta direta, à qual obteve uma resposta, que foi, aliás, a única respondida. “O que é que faz da vida?”

Depois de dizer a morada e de confirmar há quanto tempo reside no Brasil, confirmou que é “diretor da EDP Brasil”.

“Não tenho qualquer outra atividade profissional para além dessa que mencionei”, concluiu Nuno Rebelo de Sousa.

João Almeida insistiu que quer saber se há alguma relação entre Nuno Rebelo de Sousa e outras pessoas mencionadas na CPI, nomeadamente Daniela Martins, a mãe das crianças que receberam o tratamento, o seu advogado, Wilson Bicalho, e o ex-secretário de Estado, António Lacerda Sales.

Nuno Rebelo de Sousa escusa-se a responder, mas João Almeida evoca o código do processo penal e afirma que o depoente terá de responder. A resposta do depoente manteve-se.

João Almeida, perante o silêncio de Nuno Rebelo de Sousa, pede à CPI que fique registada a desobediência à comissão de inquérito.

“Sabemos que pediu a intervenção do seu pai”, na qualidade de Presidente da República, acusou João Almeida, lembrando que foi utilizado o e-mail de Nuno Rebelo de Sousa através de canais oficiais.

“Sabemos que a sua mulher recebeu um e-mail da Dra. Daniela Martins”, continua a apontar João Almeida, confrontando o depoente com o que a CPI sabe.

A deputada do PAN, Inês de Sousa Real, começa as suas perguntas com um enquadramento sobre o que a CPI sabe.

Inês de Sousa Real pergunta que “há relações de parentesco com a Dra. Daniela Martins e com as crianças”, lembrando que são questões que “não estão” sob o segredo de justiça, mas configuram “condições de identificação prévia”.

Frisando as várias “contradições” já lembradas na audição, Inês de Sousa Real afirma que “está patente algum desrespeito ao Parlamento”, por Nuno Rebelo de Sousa ter prestado “declarações à revista Sábado” e ao recusar-se “a prestar declarações ao Parlamento”.

“Como é que isto chega a uma Câmara deCcomércio”, pergunta, obtendo como resposta o habitual nesta audição.

O deputado António Rodrigues, por parte do grupo parlamentar do PSD, assume o comando das perguntas e faz um enquadramento da situação e do que está em causa.

O deputado social democrata criticou a “cortina de fumo” criada por Nuno Rebelo de Sousa.

PS diz que “silêncio” de Nuno Rebelo de Sousa adensa dúvidas da CPI

O deputado socialista João Paulo Correia considerou que Nuno Rebelo de Sousa é uma “peça chave” neste caso e afirmou que, apesar de compreender o direito ao silêncio do depoente, este também “adensa” as dúvidas da CPI.

“Aqui há duas teses possíveis”, continua o socialista, dizendo que, por um lado, Nuno Rebelo de Sousa, “se dedica a causas humanistas” e “moveu mundos e fundos para cumprir um objetivo” que lhe foi pedido.

Ou, por outro lado, há tese “do Dr. Nuno Rebelo de Sousa lobista, facilitador de negócios”, que fez o que fez a “pedido de amigos em comum”, que, por ser filho do Presidente da República, conseguiu abrir portas e atingiu o seu objetivo.

João Paulo Correia perguntou a Nuno Rebelo de Sousa se “foi pago por ter atuado neste papel de lobista e facilitador de negócios junto destas instituições públicas”, mas a resposta não foi diferente.

“Pelas razões referidas, não respondo a essa questão”, continuou o depoente, levando o deputado socialista a lembrar que o silêncio “poderá levar a conclusões da comissão de inquérito”, que posteriormente “seguem para o Ministério Público”.

João Paulo Correia perguntou ainda ao depoente se “tem mantido conversações, diálogo, com os advogados dos pais das crianças” e se lhe foi transmitido que teria havido contacto pelo advogado [Wilson Bicalho] a algum órgão de polícia criminal” na véspera da audição de Daniela Martins.

A resposta foi a mesma.

Chega pergunta a Nuno Rebelo de Sousa se tem consciência do “problema” que trouxe à imagem de Portugal.

André Ventura começou a sua ronda de perguntas interrogando Nuno Rebelo de Sousa sobre se tem consciência dos problemas que trouxe a Marcelo Rebelo de Sousa e à imagem de Portugal.

“Pelas razões referidas, não respondo a essa questão”, respondeu reiteradamente o depoente a André Ventura.

O deputado do Chega confrontou Nuno Rebelo de Sousa com e-mails trocados com a assessora do Presidente da República Maria João Ruela, nos quais alegadamente estão referências ao hospital Santa Maria, às gémeas e o nome do depoente.

“Está a fazer de nós tontos”, acusou André Ventura. “Como é que pode dizer que não conhece os pais” das crianças, questiona o deputado do Chega. A resposta manteve-se sempre a mesma.

André Ventura lembrou a Nuno Rebelo de Sousa que, à altura dos factos, terá “perguntado se não” havia “nada que possa ser feito para acelerar o processo”, e de ter dito que “a burocracia em Portugal é muito grande”.

O deputado do Chega ainda confrontou o depoente com comunicações eletrónicas às quais a CPI teve acesso e que “provam” que houve pedido de intervenção de Nuno Rebelo de Sousa ao pai, na qualidade de Presidente da República.

“Eu fico com uma certeza: o Dr. Nuno Rebelo de Sousa é o pivot principal” num processo que serviu para dar benefícios a alguém na área da saúde, acusou o deputado do Chega.

“Está a enterrar até ao fim os órgãos de soberania portugueses”, concluiu André Ventura.

Nuno Rebelo de Sousa voltou a lembrar que não tem “nada a responder”.

Começa a segunda ronda de perguntas, apesar do silêncio de Nuno Rebelo de Sousa

A deputada da IL, a primeira a inquirir o filho do Presidente da República na segunda ronda de perguntas, acusou o depoente de não ter o “mínimo interesse em responder”.

Por este motivo, não fez perguntas, ainda que tenha considerado que Nuno Rebelo de Sousa “tem uma grande importância” para o caso.

Também a deputada bloquista Joana Mortágua diz não ter perguntas para colocar a Nuno Rebelo de Sousa, principalmente “se nem o deputado João Almeida [do CDS], com as suas táticas” de advogado o conseguiu fazer, acrescenta.

Ainda assim, Joana Mortágua lembrou a importância do processo, tendo em conta os custos elevados assumidos por várias entidades, ligados à saúde e os lóbis que Nuno Rebelo de Sousa “representa”, por os publicitar.

Paulo Muacho, do Livre, sem mais explicações, não faz perguntas a Nuno Rebelo de Sousa.

João Almeida, do CDS, volta à carga e lembra que perguntas sobre a identificação, que não estão abrangidas pela exclusão evocada por Nuno Rebelo de Sousa para não responder à CPI.

“Se não responder, teremos de considerar uma participação por crime de desobediência”, sustenta João Almeida, face à recusa de resposta de Nuno Rebelo de Sousa.

“Lamentamos que as perguntas não tenham sido respondidas”, mas há também “o senhor Presidente da República” que foi afetado por esta audição, lembra a deputada do PAN Inês de Sousa Real.

Os deputados da CPI não avançaram para a terceira ronda de perguntas a Nuno Rebelo de Sousa, face ao silêncio do depoente.

Santos Silva, Francisca van Dunem e nora de Marcelo vão ser ouvidos

Ainda antes da audição, a CPI aprovou por maioria as inquirições dos antigos governantes Augusto Santos Silva e Francisca van Dunem, respetivamente ministros dos Negócios Estrangeiros e da Justiça.

O PSD, no início dos trabalhos, acrescentou ainda um requerimento para ouvir Juliana Drumond, “a pessoa que hoje vive com o Dr. Nuno Rebelo de Sousa”, considerando que é “pessoa de interesse” para a CPI.

O deputado do PSD António Rodrigues, apresentou o pedido de audição, que foi votado depois do requerimento da IL para ouvir Augusto Santos Silva. O pedido dos sociais-democratas foi aprovado por maioria.

PS questiona número de depoentes e acusa CPI de “politizar” as audições

O deputado do PS João Paulo Correia questionou o número de pessoas ouvidas na CPI do caso das gémeas no início da discussão em torno dos requerimentos para ouvir Augusto Santos Silva e Francisca van Dunem, respetivamente propostos pela IL e pelo Chega.

São cerca de 50 pessoas ouvidas na CPI, que o deputado socialista descreve como o maior número de pessoas ouvidas numa comissão de inquérito.

Sobre a audição de Juliana Drumond, pedida pelo PSD, João Paulo Correia concordou. O deputado socialista sugeriu ainda que a CPI estaria a “politizar” as audições.

O deputado do Chega André Ventura justificou a audição dos antigos governantes com o interesse da CPI.

João Paulo Coreia garantiu ainda que “O PS não iria opor-se” às audições.

O silêncio justificado por Nuno Rebelo de Sousa

Na resposta enviada pelos seus advogados do filho do Presidente da República à CPI, e à qual a Lusa teve acesso, lê-se que “Nuno Rebelo de Sousa estará na CPI por videoconferência no dia 03 de julho, pelas 14 horas”.

De acordo com os advogados, Nuno Rebelo de Sousa “invocará na íntegra o silêncio”, sustentando que “é um direito dado pela Constituição e pela Lei”.

Os advogados assinalaram que “há coincidência total entre o objeto desse processo [no qual Nuno Rebelo de Sousa é arguido] e o objeto da CPI”, e consideram não existir “questões possíveis cuja resposta não esteja prejudicada por aquela legítima invocação”.

“Entendeu-se prestar esclarecimentos na investigação criminal. Não tinha, aliás, que legalmente prestar também aí quaisquer esclarecimentos, mas foram prestados. Entende-se não o fazer em investigações paralelas e simultâneas, pese embora, em colaboração a que também se não estava obrigado, se tenha já consentido no acesso aos esclarecimentos ali prestados, todos eles”, acrescentaram.

O advogado de defesa do filho do chefe de Estado comunicou em junho à comissão de inquérito que este recusava prestar esclarecimentos, admitindo, contudo, estar presente em audição “em momentos futuros”.

Na mesma carta, Nuno Rebelo de Sousa não recusou ser ouvido no inquérito parlamentar.

Na nova missiva dirigida à Assembleia da República, é assinalado que a possibilidade de a audição decorrer por videoconferência “não constava da convocatória anterior” e que foi transmitido ao parlamento que Nuno Rebelo de Sousa não estaria em Portugal nas datas avançadas primeiramente, “tendo obrigações profissionais e familiares no Brasil, onde reside e trabalha, e também que não previa vir em breve a Portugal”.

Na passada sexta-feira, o presidente da comissão parlamentar de inquérito, Rui Paulo Sousa, indicou que a comissão também iria deliberar hoje o levantamento do sigilo profissional e a possibilidade de o advogado da mãe das crianças ser ouvido à porta fechada.

Wilson Bicalho foi ouvido na comissão de inquérito que decorre no parlamento e fez uma declaração inicial, mas recusou-se a responder a qualquer questão, alegando sigilo profissional. O advogado disse ter pedido um parecer à Ordem dos Advogados para que esse sigilo fosse levantado e que tal foi recusado.

Esta postura foi criticada pelos partidos e a audição foi suspensa ainda antes de acabar o tempo de inquirição do primeiro partido, o Chega, sem retomar.

Na terça-feira, o mandatário da mãe das gémeas entregou à comissão parlamentar de inquérito o parecer da Ordem dos Advogados (OA) portuguesa que justifica a sua recusa em prestar declarações na Assembleia da República.

Em causa no processo, que tem como arguidos o ex-secretário de Estado da Saúde Lacerda Sales e Nuno Rebelo de Sousa, está o tratamento hospitalar das duas crianças luso-brasileiras que receberam o medicamento Zolgensma.

Com um custo de dois milhões de euros por pessoa, este fármaco tem como objetivo controlar a propagação da atrofia muscular espinal, uma doença neurodegenerativa.

Fonte: Diário de Notícias / Portugal

Crédito da imagem: António Pedro Santos / LUSA