Autárquicas em números. Das 76 câmaras que mudaram de cor aos 165 presidentes no primeiro mandato

Há um novo mapa autárquico em Portugal – não tão diferente do mapa de 2021 como se chegou a esperar, mas ainda com bastantes mudanças. As eleições autárquicas de 2025 baralharam e redistribuíram o jogo nos 308 municípios.

Se nas legislativas se olha para o número de deputados, aqui olha-se, entre outras coisas, para o número de presidências de câmara que cada partido conseguiu. Aí, o título de maior partido autárquico mudou de mãos, passando para o PSD.

Se os números dos maiores partidos mudam de forma cíclica, entre altos e baixos, há um grupo que ainda não sentiu nenhuma queda: o dascandidaturas independentes.

Este clube, que apareceu em 2001 após serem permitidas as candidaturas de grupos de cidadãos, voltou a aumentar, pela quarta eleição consecutiva.

As transferências entre partidos

Várias autarquias trocaram de cor — sete fizeram-no pela primeira vez. Mas os partidos tanto perderam num concelho como ganharam noutro, complicando as contas.

Há muitos detalhes escondidos na transferências de câmaras entre partidos. Vizela passou do PS para os independentes sem mudar de presidente de câmara — Victor Hugo Salgado, investigado por suspeitas de violência doméstica contra a mulher e filho, candidatou-se a um terceiro mandato com um movimento próprio, apoiado pelo PS local mas renegado pelo PS nacional.

No sentido oposto, a autarquia da Figueira da Foz também mudou de cor sem alteração do autarca. Pedro Santana Lopes foi agora eleito para um segundo mandato consecutivo — e terceiro no total — novamente pelo PSD, já reconciliado com os sociais-democratas.

Em 2021, tinha regressado ao município litoral como independente, depois de fundar (em 2018) e abandonar (em 2020) um novo partido, o Aliança (entretanto extinto).

Há ainda pelo menos cinco casos de zangas socialistas, ou desentendimentos, que resultaram em perdas de câmara do PS para independentes.

É o caso de Soure, que Rui Fernandes venceu (liderando um grupo de ex-militantes socialistas que se desfiliaram após perder as eleições internas), assim como de Vila Nova de Poiares, onde venceu Nuno Neves (eleito presidente de junta pelo PS em 2021), e de Condeixa-a-Nova, onde a nova presidente é Liliana Pimentel (vice-presidente dessa autarquia entre 2013 e 2021), que se desfiliou do PS.

Montijo tem uma história semelhante — Fernando Caria, o novo presidente, foi presidente de junta por 12 anos, eleito três vezes pelo PS. Figueiró dos Vinhos também: o Movimento Figueiró Independente é liderado por Carlos Lopes, ex-deputado socialista e candidato pela terceira vez ao município da região de Leiria.

A derrota do PSD em Mafra também tem história. Hugo Moreira Luís substituiu, em junho de 2024, Hélder Sousa Silva — eleito eurodeputado, estava já no terceiro mandato consecutivo em Mafra —, e chegou a ser anunciado como cabeça de lista dos sociais-democratas pela concelhia.

Contudo, a comissão política nacional do PSD escolheu José Bizarro, derrotado por Hugo Moreira Luís nas eleições internas da concelhia, e o presidente substituto decidiu candidatar-se como independente. Venceu.

Em Setúbal, a candidata independente vencedora, Maria das Dores Meira, roubou a autarquia à CDU — que passou da presidência para quarta força política no concelho. Dores Meira, claro, presidiu a Setúbal pela CDU entre 2006 e 2021, e desfiliou-se do PCP em 2024.

Entre as autarquias que não mudaram de partido, há uma curiosidade em Porto Moniz. O PS manteve a presidência da câmara não só no partido, como na família — Olavo Câmara, o novo presidente e ex-líder da JS Madeira, é filho de Emanuel Câmara, que presidia a Porto Moniz até agora.

Emanuel, eleito deputado nas legislativas de 2025, vai agora assumir o mandato na Assembleia da República, enquanto Olavo vai render o pai em ‘casa’.

As contas dos mandatos

Para recuperar a liderança da Associação Nacional de Municípios, o PSD tinha de eleger muitos presidentes para um primeiro mandato. E foi isso que fez, elegendo 75 autarcas – alguns, como Luís Filipe Menezes, com mais história do que outros. Mas os socialistas não ficaram muito atrás.

Depois destas eleições autárquicas, há 50 presidentes que não se podem recandidatar, em 2029, ao município que presidem. A lei define um limite de três mandatos consecutivos no mesmo município para os autarcas.

Candidatos na vizinhança com 44% de eficácia

Estas eleições contavam com nove candidatos em concelhos vizinhos ao que presidiam pelo terceiro mandato consecutivo. Nem todos alcançaram o objetivo de continuar a carreira autárquica.

Belmonte tinha dois candidatos de municípios vizinhos, e ambos socialistas: Vítor Pereira, que era presidente na Covilhã e foi o candidato do PS a Belmonte, e António Luís Beites, presidente em Penamacor. Beites venceu, com uma candidatura independente.

Outro socialista, António Pina, era presidente em Olhão e ganhou as eleições em Faro. Já José Manuel Ribeiro, presidente em Valongo pelo PS, não venceu na Maia, nem Pedro Ribeiro, presidente socialista em Almeirim, venceu em Santarém (onde o PSD manteve o poder).

Na CDU, Carlos de Sá era presidente de Évora, e foi agora eleito para a autarquia de Montemor-o-Novo. Já Álvaro Beijinha, autarca em Santiago do Cacém, venceu em Sines, destronando o PS — cujo presidente, Nuno Mascarenhas, não se recandidatou devido à limitação de mandatos.

João Português, presidente em Cuba, e Vítor Proença, presidente de Alcácer do Sal, não foram bem sucedidos nas candidaturas da CDU a Santiago do Cacém e a Ferreira do Alentejo.

Bastiões em queda

Pela segunda eleição consecutiva, sete bastiões caíram nas autárquicas. Restam agora 17 câmaras cuja cor partidária nunca mudou desde 1976.

As 17 são: do PSD, Calheta (Madeira), Câmara de Lobos, Oleiros, Boticas, Valpaços, Arcos de Valdevez e Santa Maria da Feira; do PS, Campo Maior, Gavião, Portimão, Olhão, Odivelas e Alenquer; e a CDU tem Avis, Arraiolos, Seixal e Palmela.

Abstenção mais baixa em 20 anos

Votaram este domingo mais 500 mil pessoas do que em 2021, resultando numa taxa de abstenção de 40,7% — cinco pontos abaixo da taxa de 2021.

Abstenção mais baixa só em 2005, quando votaram 5,3 milhões de pessoas e a taxa foi de 39,0%.

Isso significa que a taxa de abstenção foi de 40,7% – mais de cinco pontos abaixo de 2021, quando a abstenção esteve nos 46,4%.

Para encontrar um número maior de votantes em autárquicas é preciso recuar até 2009, quando votaram um total de 5.533.824 eleitores.

A taxa de abstenção é, ainda assim, ligeiramente inferior à das legislativas de maio deste ano, ainda que neste ato eleitoral esteja incluído o círculo de emigração, com uma maior abstenção. No território nacional, nas eleições legislativas deste ano, a taxa de abstenção foi de 35,6%.

Os números mostram um cenário muito positivo face ao que se perspetivava, quando as sondagens à boca de urna apontavam para um cenário de abstenção entre os 43 e os 48%, o que não se comprovou.

Fonte: www.rr.pt

Crédito da imagem: António Cotrim / Lusa