Foi com gritos de “reconquista” que terminou a manifestação do Chega “contra a imigração descontrolada e a insegurança nas ruas”.
A falar para “milhares e milhares” de pessoas, no palanque montado num dos extremos do Rossio, tendo pela frente uma multidão que agitava bandeiras, sobretudo nacionais, mas também do partido e da monarquia, André Ventura endureceu o discurso, apelando a um “movimento de reconquista da identidade e da alma nacional”, no mesmo tom das palavras de ordem repetidas ao longo dos mais de quatro quilómetros que na tarde deste domingo partiu da Alameda D. Afonso Henriques.
Falando para os apoiantes que passaram pela Rua da Betesga para encher mais de metade do Rossio, numa mobilização que terá excedido os “três mil, pelo menos”, vaticinados no ponto de partida, o presidente do Chega não conteve o entusiasmo ao dirigir-se aos “vindos de todo o país” que formaram uma plateia notoriamente interclassista, intergeracional e em que mesmo a predominância caucasiana foi mais reduzida do que os adversários poderiam imaginar.
“É a primeira vez em toda a enorme História de Portugal em que milhares e milhares saem às ruas para dizer que Portugal ainda nos pertence, que quem não vem por bem tem de sair, e que Portugal ainda é nosso”, disse André Ventura, enunciando algumas bases daquilo que descreveu como “a luta das nossas vidas”, e que “terá de ser escutada pelo Governo e pela Assembleia da República”.
Logo nas declarações iniciais, ao chegar à Alameda, onde já se concentravam as principais figuras do Chega, ao som dos bombos dos Zés Pereiras de Barcelos que marcaram o ritmo durante a descida da avenida lisboeta mais associada à imigração e ao multiculturalismo, o líder do Chega dissera que, se “deixarem entrar 15% de estrangeiros em Portugal, não haverá casas e Serviços de Saúde para todos, tal como não haverá segurança nas ruas”, voltando a defender – tal como fez durante a campanha eleitoral – que é necessário impor quotas máximas de imigração, definidas todos os anos pela Assembleia da República.
No palanque do Rossio, com o Teatro Nacional D. Maria II por trás, Ventura preferiu dizer que “temos o dever de exigir a quem nos governa que defenda e proteja as nossas fronteiras”. Até porque, salientou, “um país sem fronteiras é uma bandalheira a céu aberto”.
Mesmo ao pretender contrariar “aqueles que dizem que somos racistas, xenófobos e não queremos estrangeiros”, Ventura afirmou que os participantes na manifestação “sentem que o país nos está a fugir das mãos” e que “estamos a perder o controlo das terras que eram nossas”. Algo que garantiu estar a acontecer não só nas principais cidades, e em localidades conotadas com a imigração, como Odemira ou Vila Nova de Milfontes.
“Deixámos nos últimos anos que isto se espalhasse pelas ruas de Portugal”, começou por dizer, sem explicitar a que se referia com “isto”, enunciando “tiroteios, facadas e criminalidade à luz do dia” para concluir que “este não é o país que amamos e pelo qual lutámos”.
E, insistindo que “não estamos contra ninguém, como nunca estivemos”, defendeu que quem comete crimes “deve ser devolvido à sua terra”.
Com milhares a repetirem um uníssono, sucessivas vezes, a palavra “deportação”, Ventura garantiu que “estamos no caminho de começar a mudar a Portugal”, algo que referiu “ser impensável” antes de o Chega aparecer. “Quando uma nação desperta não há nada, nem ninguém que a possa manter adormecida”, disse aos apoiantes.
Acenos para as janelas
No percurso da manifestação, na primeira fila, ao lado dos deputados Diogo Pacheco de Amorim, Pedro Pinto, Marta Silva, Pedro Frazão, Rita Matias, Rui Paulo Sousa, Patrícia Carvalho e Filipe Melo, o presidente do Chega esteve sempre sorridente, face à confirmação de que as estruturas do partido tinham passado o teste da mobilização para Lisboa – algumas fizeram questão de empunhar pendões alusivos à sua proveniência -, e até acenou para quem assistia à manifestação nas janelas e varandas.
Houve momentos em que os acenos foram retribuídos, com a maioria das reações a pender para o neutro, mas sem provocações de parte a parte.
O antigo atleta olímpico Marco Fortes, segurança de Ventura, muito atento, junto à primeira fila, teve poucas preocupações, enquanto o dirigente Manuel Matias coordenava o staff com que a organização procurou acautelar quaisquer incidentes, com o único momento de tensão resolvido pela PSP.
Facilmente identificáveis entre os milhares que desceram a Almirante Reis eram os elementos do Grupo 1143 e do Reconquista, com os segundos menos discretos, tantas foram as vezes que fizeram o speaker iniciar palavras de ordem para abafar gritos de “Solução: remigração”.
Do Chega ouviram-se os clássicos “Ventura, vai em frente, tens aqui a tua gente”, “chega de bandalheira, controlem as fronteiras” e, entoado como cântico de claque, “Portugal é nosso, e há de ser, Portugal é nosso, até morrer”. Mas o que mais se ouviu foi o hino nacional, que encerrou a manifestação, depois de falar o “futuro primeiro-ministro de Portugal”.
Dois detidos no único momento de tensão
Com a PSP a bloquear a ligação da Avenida Almirante Reis ao Largo do Intendente, onde teve lugar o evento “Não Passarão”, criando uma barreira com quatro viaturas policiais, o único momento de tensão ocorreu a alguns quarteirões de distância.
Depois de pouco mais de uma dezena de contramanifestantes, alguns de cara tapada, serem impedidos de se aproximarem da coluna do Chega junto à Igreja dos Anjos, dois jovens acabaram detidos, metros à frente, por atirarem objetos aos manifestantes. A intervenção rápida da PSP evitou confrontos.
Fonte: Diário de Notícias / Portugal
Crédito da imagem: Leonardo Negrão