“A diversificação da nossa economia é uma necessidade incontornável”. A premissa foi defendida esta quarta-feira pelo Presidente de Angola, João Lourenço, num discurso particularmente simbólico sobre o Estado da Nação, decorridos 50 anos desde a proclamação da independência do país por Agostinho Neto.
Nesse sentido, acrescentou o Chefe de Estado angolano, o país deve “continuar a assumir a agricultura como a base” e “a indústria como o fator decisivo para o nosso progresso, como referiu o saudoso Presidente António Agostinho Neto”.
Com cerca de 35 milhões de habitantes – tinha 6,5 milhões de habitantes em 1975 e estima-se que atinja os 68 milhões em 2050 -, Angola enfrenta um “rápido crescimento”.
Com ele chegam “desafios em todos os domínios, com destaque para a disponibilização de serviços sociais às populações em quantidade e com a qualidade que desejamos, sobretudo nos domínios da saúde, da educação, da habitação e da assistência social”, listou o Presidente de Angola.
E as soluções materializam-se em várias iniciativas direcionadas para o desenvolvimento, entre as quais a Estratégia de Longo Prazo Angola 2050 e a Estratégia Nacional para o Mar de Angola 2030, cujas ações visam proteger “a sustentabilidade dos recursos marinhos, através de reformas legislativas, a reforçar o combate à pesca ilegal, a fomentar a aquicultura continental e a fomentar a produção sustentável do sal”.
Hoje, o país garante a sua autosuficiência, com uma produção de sal em torno de 200 mil toneladas. Na pesca, o investimento que tem vindo a ser feito fortaleceu um setor que contribui hoje com cerca de 3,1% do PIB, assegurando o “sustento direto” a mais de 180 mil agregados familiares.
Sublinhando que não existe “desenvolvimento sem infraestruturas”, João Lourenço recordou que, no quadro do mandato que assumiu na União Africana (UA), o Estado angolano “elegeu o pilar do financiamento das infraestruturas do continente como um aspecto central para a projeção do desenvolvimento”.
Olhando para o crescimento da economia – em 1974, o PIB estimado em dólares americanos ajustados pela inflação era de 3 365 000 000 de dólares, representando um per capita de 517 dólares -, no ano passado, o Produto Interno Bruto per capita chegou aos 2.364 dólares. “Em 1974, a balança de pagamentos era superavitária em 2,3 mil milhões de dólares e em 2024 foi superavitária em 21,6 mil milhões de dólares”, acrescentou.
“Sistema financeiro moderno” e “cada vez mais inclusivo”
Nas palavras de João Lourenço, as reformas levadas a cabo ao longo do tempo garantem hoje ao país “um sistema financeiro moderno e em normal funcionamento”. “Desde 2002 que temos um sistema de pagamentos electrónicos, com o surgimento do sistema de cartões de pagamento Multicaixa”, destacou.
De acordo com o Presidente angolano, o índice de inclusão financeira no país atinge os 49% da população, devendo chegar aos 65% até 2027.
“O sistema financeiro é cada vez mais inclusivo, registando-se uma evolução de quase inexistência para os nacionais em 1975, para uma taxa de bancarização de 21% em 2021 e de 32% em 2024”.
No campo das reformas estruturais, recordou a organização e regulação do sistema financeiro não bancário, e, com ela, a criação e operacionalização do mercado de capitais. Como a Comissão de Mercado de Capitais e da Bolsa de Dívida e Valores de Angola (BODIVA).
“As importantes reformas feitas ao longo dos tempos abrangeram o sector empresarial público, havendo, em 2024, 87 empresas detidas directamente pelo Estado. As reformas vão continuar tendo em vista uma maior eficiência económica e financeira das empresas detidas pelo Estado, no quadro do Programa de Privatizações”, continuou.
“Depois de períodos bastante difíceis caracterizados por cenários de hiperinflação, decorrentes da situação política e económica prevalecentes, chegando a motivar trocas de moeda, a reforma cambial de 1999 dotou o Banco Central de instrumentos essenciais para combater a hiperinflação conduzindo a uma redução substancial da inflação, tendo a taxa média passado de cerca de 900% nos anos 90, para 18,8% nos dias de hoje”.
“Apesar destes avanços, há ainda trabalho a fazer até alcançarmos, no médio prazo, uma maior estabilidade dos preços dos bens e serviços na nossa economia. Uma inflação mais baixa e estável é premissa fundamental para a estabilidade macro-económica e social do nosso país”, acrescentou.
“Sistema nacional de saúde inequivocamente mais forte”
Passando ao setor da saúde, de acordo com João Lourenço, o Serviço Nacional de Saúde é hoje “capaz de assegurar resultados sólidos”, graças ao “investimento feito no capital humano, nas infraestruturas, nos mecanismos de gestão dos medicamentos, na municipalização dos serviços, na regulamentação do setor”.
A melhoria dos indicadores foi igualmente relevada pelo Chefe de Estado, sublinhando a melhoria “significativa” da saúde materna e infantil. Na mortalidade infantil, os dados apontam para uma queda de 44 para 32 por mil nados vivos, a mortalidade de menores de cinco de 68 para 52 por mil nados vivos e a mortalidade materna de 239 para 170 por 10 mil nados vivos.
“Os dados estatísticos positivos animam-nos também a continuar o processo de municipalização no setor da saúde”, sublinhou.
Nos cuidados primários de saúde, foi observado um aumento de 10% do número de consultas, totalizando-se acima de 20 900 000 consultas (73,6% do total de consultas). “O nível primário continua a ser a porta de entrada do serviço nacional de saúde e, portanto, merecedor da nossa atenção”, afirmou.
“Com o investimento no nível primário, os principais indicadores de saúde pública melhoraram. Aumentou a cobertura da quarta consulta pré-natal e do parto institucional, tendo aumentado também o número de unidades sanitárias que realizam consultas de atenção integral à criança, assim como aumentou a cobertura de crianças vacinadas”, afirmou.
Não escondendo os “múltiplos desafios que ainda persistem”, os investimentos feitos pelo Governo, “particularmente nos últimos sete anos”, ressalvou, pintam um “quadro é bastante diferente” para o setor.
“Graças ao investimento feito, o Serviço Nacional de Saúde conta hoje com 3.355 unidades sanitárias, contra as 320 existentes em 1975. Estão disponíveis 44.222 camas, 1.609 das quais para cuidados intensivos”.
“Foi feita uma verdadeira revolução no que respeita aos cuidados médicos às pessoas com doença renal, passando o país a contar com 35 instalações de hemodiálise em 12 províncias, estando a acompanhar 4.762 utentes e a realizar 601.152 sessões de diálise por mês. Estes números representam um aumento de 43,6% do total da força de trabalho do sector da saúde desde 2018”, explicou.
No investimento na formação especializada dos médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico e terapêutica em áreas estratégicas para o país, o Governo antevê que a mesma chegue a 38 mil profissionais do setor até 2027.
Quanto à indústria farmacêutica, os planos do Governo visam uma “redução substancial da importação de medicamentos, vacinas e material gastável de grande consumo”.
“A estratégia de redução das importações tem de chegar também ao sector da saúde. Registamos como passos animadores a transferência de tecnologia e a produção nacional de uma diversa gama de material gastável e meios médicos por algumas unidades empresariais já instaladas em Angola.
Educação decisiva para o desenvolvimento
“A aposta no capital humano angolano continuará a passar pela educação, sector que vai continuar a merecer o nosso total empenho, por ser decisivo para o nosso desenvolvimento”, defendeu João Lourenço.
Recordando uma herança colonial que deixou “um sistema limitado e desigual que deixava a maioria da população sem acesso à educação formal”, o Presidente de Angola recordou que, em 1975, 85% dos angolanos eram analfabetos.
Hoje, é de cerca de 24%. Quanto ao números de alunos nas escolas, estão matriculados mais de mais de 9.600.000 para o ano letivo 2025/2026, estão e 208.488 professores estão colocados nas várias escolas.
“Em 1978, o país fez a primeira reforma educativa, implementando o Sistema Nacional de Educação e Ensino, o qual rompeu com o modelo colonial, estabelecendo o ensino básico gratuito até à 4.ª classe e a expansão gradual até à 8.ª classe”.
“Nessa altura, foi igualmente lançada a Campanha Nacional de Alfabetização, tendo sido matriculados cerca de 2,4 milhões de alunos no ensino básico inicial e 1 milhão na formação de adultos, com o apoio de mais de 700 professores expatriados”, continuou.
De acordo com João Lourenço, a classe de iniciação é oferecida hoje em 85% das escolas estatais, tendo a taxa bruta de escolarização chegado aos 64,4% no ano lectivo passado (2024/2025). Contudo, sublinha “a necessidade de continuar a trabalhar para aumentar a taxa bruta de escolarização no ensino secundário”.
Entre as reformas adotadas para promover o aumento da oferta e à melhoria da qualidade de ensino estão a “aprovação do Estatuto da Carreira dos Agentes da Educação e do Plano Nacional de Formação e Gestão Docente 2018–2022, bem como a melhoria das regras para ingresso, progressão na carreira, formação contínua, carga horária e mobilidade dos docentes”, listou João Lourenço, elegendo “o professor” como “um dos pilares principais para o sucesso do sistema educativo” de Angola.
Olhando para mais números da docência, o Estado nomeou definitivamente para o quadro, entre 2018 e 2025, 125.385 professores que se encontravam em regime probatório e eventual. No concurso público de ingresso externo relativo ao ano letivo de 2023/2024 foram admitidos 8.653 professores.
“Esses dados revelam bem a nossa preocupação com o capital humano, por isso vamos continuar a trabalhar para a admissão de mais pessoal e para a actualização contínua das categorias, bem como noutros domínios necessários à valorização dos quadros ao serviço da educação”, garantiu.
Por outro lado, considerando a necessidade de andarmos mais rapidamente para invertermos esta situação, vamos implementar um programa especial para a educação com incidência municipal, contemplando a construção e reabilitação de escolas do ensino de base em todo o país, a formação e a admissão de profissionais de educação, estando para isso mobilizados 500 milhões de dólares para os próximos dois anos.
No ensino superior, a meta são os 16% de taxa bruta de frequência até 2050. Hoje contam-se mais de 330 mil estudantes.
“Crucial redirecionar a oferta formativa para o mercado de trabalho”
Angola, como um país “maioritariamente jovem”, sublinha João Lourenço, “lida com problemas de acesso à educação, mas também de acesso ao mercado de trabalho após a formação”, pelo que se afigura “crucial redirecionar a oferta formativa para o mercado de trabalho”.
“A reforma que temos implementado no ensino técnico e profissional visa atender esta visão. Estamos a aumentar o número de instituições de ensino técnico e profissional para atender cada vez mais alunos”, explicou.
A rede de centros de formação profissional começou a evoluir especialmente em 1998, chegando hoje a uma oferta formativa diversificada que contempla mais de 305 especialidades em áreas como artes e ofícios, agricultura, administração e serviços, turismo, tecnologia, informática e construção civil.
“A adequação da formação às necessidades reais do mercado é um dos grandes desafios identificados. É nosso objetivo disponibilizarmos uma maior oferta formativa em domínios com maior potencial de absorção de mão de obra qualificada”, sublinhou.
Quanto ao emprego jovem – “um dos maiores desafios de países com um perfil etário bastante jovem”, – a realidade exige que todos os setores da economia “cresçam e gerem emprego de qualidade e bem remunerado para os jovens angolanos”. “Estamos a fomentar a geração de emprego por via do autoemprego.
Através do Fundo Nacional de Emprego de Angola (FUNEA), 26.932 cidadãos já beneficiaram de apoios no âmbito do Programa Jovens e Oportunidades de Bons Empregos em Angola (JOBE ANGOLA), que engloba estágios profissionais, microcrédito e oferta de kits profissionais.
Fonte: O Jornal Económico / Portugal
Crédito da imagem: Ampe Rogério / Lusa