Portugal tem estado atrasado, há anos, na execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que tem reservados cerca de 22 mil milhões de euros para o país (o período elegível para concorrer aos fundos, que foram instituídos em julho de 2021 e vai até ao final de agosto de 2026).
Mas a demora no cumprimento de metas e medidas que mereçam a aprovação da Comissão Europeia (CE), para depois receber o financiamento (a fundo perdido ou empréstimos), continua a sofrer atrasos graves que preocupam a Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR (CNA-PRR).
A CNA detetou um aumento muito grande do número e peso no total de investimentos e projetos em situação “crítica”. Muitos são relativos a obras e construções que se encontram paradas ou que não arrancaram sequer, explicou o presidente da comissão, Pedro Dominguinhos.
A CNA revela ainda que, até agora, o impacto renovador e inovador na economia é relativamente reduzido, tendo em conta que já passaram quatro dos cinco anos que deve durar o PRR (até finais de 2026): tendo decorrido já cerca de 80% do tempo estimado para a aplicação do Plano, a comissão de acompanhamento revela que os beneficiários finais receberam pouco mais de um terço (35%) do total de fundos do PRR. Isto é, quando falta um ano e pouco para mostrar a Bruxelas o cumprimento das últimas metas.
Nestes dez meses que decorrem entre os dois estudos da Comissão de Acompanhamento, o peso dos recebimentos para os projetos elegíveis para o PRR (aprovados) avançaram, claro, embora representem pouco mais de metade (51%) das verbas totais prometidas ao país neste valioso pacote criado em 2021 para combater os efeitos nefastos da pandemia na atividade económica e na despesa pública.
“Considerando o 6º pedido de pagamento, as verbas recebidas passarão para cerca de 57% do total e o nível de cumprimento de marcos e metas para 40%.”
De acordo com o relatório da CNA apresentado esta quarta-feira, que faz o ponto da situação “entre julho de 2024 e início de maio de 2025” (a avaliação anterior é de julho do ano passado e incide sobre o período que vai de novembro de 2023 a junho de 2024), registou-se um aumento significativo da proporção de investimentos em estado “crítico”, de 8% (no relatório de julho de 2024) para 20%, agora. O seu peso mais do duplicou.
“Quando falta cerca de um ano para a conclusão do PRR, pese embora alguns destes investimentos só tenham metas/marcos incluídos nos 9º e 10º pedidos de pagamento, esta situação representa um risco muito elevado para se conseguirem alcançar as metas previstas”, sublinha a comissão presidida por Pedro Dominguinhos.
E acrescenta: “Para além de representar um risco de não recebimento das verbas associadas, significa que os resultados e impactos perspetivados terão muita dificuldade em concretizar-se”.
Portugal concretizou “a submissão e o recebimento do 5º pedido de pagamento, bem como a submissão do 6º pedido de pagamento (embora com evidências em fase de recolha e com marcos e metas que foram removidas após a reprogramação), o que significa um recebimento das verbas equivalente a cerca de 51% do montante global do PRR e cumprimento de 33% das metas e marcos”. Em julho de 2024, estavam em situação “preocupante” 29% e agora baixou para 13%.
Mas é urgente acompanhar e perceber como está a correr no terreno, diz a equipa de peritos. É “necessário acompanhamento” em cerca de 35% dos investimentos (era 25% em julho do ano passado).
A CNA nota ainda uma “aceleração ligeira de pagamentos a beneficiários finais, tendo sido transferidos cerca de 3.000 milhões de euros, em 10 meses, a um ritmo médio de 300 milhões euros por mês, que compara com uma média de 225 milhões euros/mês no período incluído no relatório anterior”.
Tudo considerado, “neste momento, o volume de pagamentos situa-se nos 7.779 milhões de euros (data referência de 22 de maio), 35% do total do PRR”, revela a comissão. É este o valor que chegou efetivamente à economia.
Alguns exemplos de projetos em estado “crítico”
Um dos projetos em estado crítico, e que não estava antes, é o dos “cuidados de saúde primários com mais respostas”, do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
“Considera-se ser de agravar este investimento para crítico” porque nos relatórios anteriores da CNA-PRR (de 2022, 2023 e 2024) “foram elencadas uma série de recomendações, que, face à situação atual, se consideram não ter sido consideradas”
Não houve “acompanhamento regular e proativo junto das ULS [unidades locais de saúde] e dos municípios, relativamente às construções, mas também a todas as outras aquisições, bem como a atenção redobrada da tutela e duma interligação profunda entre a ACSS – Administração Central do Sistema de Saúde e a SPMS – Serviços Partilhados do Ministério da Saúde”.
“Numa área tão sensível e importante para a população como é a saúde e tendo em atenção as alterações profundas que se verificaram na orgânica do SNS, a complexidade dos processos tornou-se ainda maior, com a necessidade de alterações, adendas aos contratos e pedidos de reprogramação”, diz a comissão.
O investimento no programa de apoio ao acesso à habitação também continua em estado “crítico”.
Segundo o novo relatório de acompanhamento, “o mecanismo de Regime Especial de Financiamento, a partir da integração de mais 10.000 fogos, poderá ser uma base para possibilitar chegar à meta de 26.000 fogos”.
“No entanto, o grande problema são as capacidades instaladas no país para dar resposta às várias solicitações de construção civil e as fases anteriores à empreitada, em que se encontram uma parte relevante dos projetos”.
Assim, a CNA refere que “necessitamos de perceber o impacto do Decreto-Lei 44/2025, fundamentalmente pelo número de novos projetos em fases avançadas de obras, e o seu contributo para a meta dos 26.000 fogos. Sem esta análise fina, a probabilidade de concretização da totalidade dos fogos revela-se baixa.”
Depois há investimentos de grande magnitude que nem sequer estão a ser monitorizados. É o caso do Hospital de Todos-os-Santos (“Hospital Lisboa Oriental”), lançado no ano passado pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro.
“Tem um valor total de aproximadamente 350 milhões de euros e conta com uma contribuição de 100 milhões de euros do PRR”, segundo a construtora Mota-Engil, um dos maiores parceiros privados do Estado nesta obra pública (PPP). “Não acompanhado”, diz a CNA.
Fonte: Diário de Notícias / Portugal
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