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O pedido de Marcelo a Montenegro? Que continue a haver “bom senso”

Numa mensagem dividida em três espaços distintos e necessariamente ligados – Portugal, Europa e o mundo -, Marcelo Rebelo de Sousa deixou esta quarta-feira um apelo na sua penúltima comunicação de Ano Novo ao país na qualidade de Presidente da República: “Precisamos de renovar a nossa democracia, não a deixar envelhecer.”

“Eu acredito, como sempre, em Portugal.” Foi com esta frase que terminou, mas a ideia nela contida foi o elemento agregador da primeira mensagem de Marcelo para este ano, com uma amplitude que levou o chefe de Estado a desconstruir a democracia e a economia.

A missiva do Presidente passou por apelar a “uma economia que cresça e possa pagar melhor e aumentar os rendimentos dos portugueses, assim corrigindo também as suas desigualdades”.

Recuperando avisos que deixara nas suas mensagens de 2022 e 2023, em plena maioria absoluta de António Costa, Marcelo não evitou críticas e avisos muito diretos ao atual Governo, estendidas ao anterior, sobre a execução dos fundos comunitários do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR):

“Precisamos que os 16 mil milhões do PRR que temos para gastar nos próximos dois anos sejam mesmo usados. E façam esquecer os 6 300 milhões que gastámos, que usámos no mesmo tempo ainda maior até hoje.”

Marcelo resumiu o seu pedido a uma ideia de progresso, que ultrapassou o escopo das contas públicas: “Precisamos que Portugal fique mais preparado para enfrentar as aceleradas mudanças na Europa e no mundo.”
Sobre os 50 anos da democracia, assinalados no ano passado, Marcelo lembrou Mário Soares e o 25 de Abril, mas deixou transparecer a ideia de que a democracia estava incompleta sem justiça social.

“Percebemos que não queremos perder nem liberdade, nem democracia. Mas também percebemos que um ciclo se fechou. 50 anos. E evocar Abril é olhar para o futuro, não é repetir o passado. Precisamos de menos pobreza. A pobreza nos 2 milhões de portugueses é um problema de fundo estrutural que a democracia não conseguiu resolver.”

Para ir mais longe, o chefe de Estado cultivou a ideia de progresso que já tinha deixado: “Precisamos de ainda mais educação, de melhor saúde, de melhor habitação. Para isso precisamos de qualificar mais os recursos humanos. Inovar mais. Competir com mais produtividade.”

Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que é preciso “que o bom senso que nos levou a reforçar a solidariedade institucional e até a cooperação estratégica entre órgãos de soberania, nomeadamente Presidente da República e Primeiro-Ministro, prossiga e que nos levou também a aprovar os Orçamentos 2024 e 2025, continue a garantir estabilidade, previsibilidade e respeito cá dentro e lá fora”.

Em concreto sobre a renovação democrática que pediu, Marcelo referiu todos os aspetos em que o regime deveria prosperar:

“Em juventude, no papel da mulher, no combate à corrupção, na construção da tolerância e do diálogo, na recusa da violência pessoal, doméstica, familiar e social, na capacidade das forças políticas, económicas e sociais, mas também do sistema de justiça, mas também da Administração Pública para se virarem para o futuro, para melhor servirem a comunidade.”

Como evocação nacional, o Presidente lembrou a “visão universal” de Camões, no ano em que se celebrou os 500 anos do seu nascimento, e, sem referir o seu nome, aludiu a Adília Lopes – – “uma poeta grande, embora discreta, que nos deixou há dias” -, parafraseando-a: “Nunca perdeu nada nem deitou nada fora ao longo da sua vida.”

Com esta alusão, o chefe de Estado procurou abarcar a noção de ser português, com uma referência breve ao passado colonial e à gestão atual da imigração: “Aprendemos com tudo e todos, com todos. Não temos o monopólio da verdade e não deitamos nada fora. Guardamos para a nossa memória coletiva de séculos.”

Em ano de Eleições Autárquicas, o Presidente da República afirmou que “o povo será o juiz supremo da nossa resposta perante tantos desafios”. Ainda na onda do reforço da democracia, referiu o 25 de Novembro: “A vitória dos moderados nessa revolução em novembro de 75 e a coragem dos capitães de abril de devolverem em 82 o poder pleno ao povo para que ele desse vida à democracia em Portugal, eu acredito na vontade experiente e determinada do povo português.”

Trump e as relações com a UE

Marcelo Rebelo de Sousa encetou a sua mensagem com uma receita de como Portugal deve comportar-se perante o mundo e como o velho continente deve reagir aos desafios internacionais, desde logo perante “as duas principais guerras” que se agravaram em 2024.

Numa referência aos governos alemão e francês, Marcelo recordou as Eleições Europeias, em junho, que “permitiram um alívio momentâneo a certos líderes e partidos no poder”, mas “curto”, tendo em conta que estas “economias fortes” continuaram “a descer, e governos dessas economias a caírem já ou a prosseguirem a sua queda lenta”.

Sobre o acontecimento político internacional mais recente, Marcelo referiu “as eleições norte-americanas”, que “deram o regresso a 2016”, com a reeleição de Donald Trump, “permitindo ao vencedor definir sobre a paz que quer, na Ucrânia como no Médio Oriente”.

E deixou uma interrogação retórica, que antevê uma incerteza para a Europa: “Uma paz justa, duradoura, respeitadora do direito internacional e do direito humanitário, e por isso da dignidade das pessoas? Ou uma paz injusta, precária, ignorando o direito e o respeito das pessoas e da sua situação humanitária, e, para isso, tendo de escolher entre querer colaborar com a União Europeia ou dela querer afastar-se, com a Federação Russa e a China ganharem mais ou menos consoante das posições americanas?”

Como potencial resposta para a dúvida sustentada, Marcelo desconstruiu as possibilidade:

“Mais aliança entre Estados Unidos da América e União Europeia, na economia, na política, na Ucrânia, no Médio Oriente, é melhor para a Europa, e é pior para a Federação Russa e para a China. Menos aliança é melhor para a Federação Russa e para a China. Neste quadro, o que a União Europeia tem pela frente como desafios é primeiro tudo fazer pela aliança com os Estados Unidos da América. Mas não contar só ou sobretudo com isso. Manter-se unida.”

Fonte: Diário de Notícias / Portugal

Crédito da imagem: Paulo Sprangler