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Procura histórica por viagens ao estrangeiro cresce 20% no verão e fim de ano

A sede dos portugueses em viajar para fora de portas deu às agências de viagens um ano recorde nas vendas. A procura do mercado nacional para pacotes de férias para o estrangeiro disparou 20% para a época de verão e, às portas do fim de ano, o cenário repete-se com uma corrida antecipada às miniférias de réveillon.

O interesse pujante dos residentes e a antecipação histórica nas reservas deixaram o próprio setor atónito, que, há um ano, temia os eventuais impactos da inflação no poder de compra das famílias.

“Estamos um pouco admirados com a evolução das reservas, é muito difícil de explicar até face à inflação que já tinha existido em 2023. Estas reservas antecipadas que nos indicam um crescimento de 20% traduziram-se num ponto de interrogação. Com as taxas de juro altas, que impactaram os créditos à habitação, e com a inflação, esta procura sempre foi um motivo de interrogação para nós”, refere ao DN o presidente da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT).

Pedro Costa Ferreira acredita que a vontade de viajar “é muita”, principalmente depois do período da pandemia, e assegura que é “provavelmente das primeiras necessidades a serem satisfeitas depois das mais básicas” ocupando a lista de prioridades dos consumidores.

Mas há outros fatores que podem ajudar à leitura dos números. “Por um lado, há a hipótese de as pessoas estarem a gastar algumas poupanças, sobretudo a faixa etária mais alta. Por outro lado, também é verdade que há já um movimento de descida das taxas de juro, a inflação parece estar sob controlo e isto, do ponto de vista psicológico, pode também estar a induzir o consumidor a ter uma vida mais normal”, indica.

O preço é outra das franjas que entra na equação na hora de planear as férias e que pode justificar este interesse por viagens internacionais. À boleia da inflação e do aumento dos custos, viajar ficou mais caro este ano com os pacotes a subir cerca de 5% face a 2023, confirmam as várias agências de viagens ouvidas pelo DN.

“De forma geral este ano revelou um aumento de preços generalizado na maioria dos produtos, desde a aviação, à hotelaria , sem exceção para a maioria dos pacotes de verão que também subiu face ao ano anterior. Em segmentos de nicho, como por exemplo o turismo cultural ou o turismo religioso notou-se um forte aumento de preços, com impacto na compra”, explica a diretora de marketing e comunicação do grupo Wamos, que detém a agência de viagens Top Atlântico, Margarida Blattmann.

Os operadores admitem que os destinos concorrentes de Portugal ganharam escala com ofertas mais apelativas, o que levou os residentes a trocar os habituais destinos de férias no país, como o Algarve, por outras geografias no estrangeiro.

“A subida dos preços na hotelaria nacional, impactou significativamente as férias de lazer dos portugueses que em muitos casos optaram por desviar as habituais férias em território nacional para destinos internacionais mais acessíveis e com uma relação preço/qualidade mais justa”, aponta a responsável.

Já o presidente da APAVT recusa uma leitura pessimista do cenário e admite que a “queixa” de que Portugal está a ficar um destino caro é, na verdade, “uma queixa boa”.

“Não desgosto nada da ideia de um mundo em que há mais portugueses no estrangeiro e há mais turistas estrangeiros em Portugal. Prefiro esse mundo do que um mundo em que os portugueses só podem estar em Portugal porque não conseguem viajar lá para fora por causa do preço e em que os turistas estrangeiros não podem vir a Portugal. Se nos queixamos de mais turistas portugueses no estrangeiro e mais turistas estrangeiros em Portugal , fico satisfeito com essa queixa, é uma queixa boa”, sublinha.

Reservas antecipadas

Se nos últimos anos marcados pela pandemia do covid-19 a incerteza era combustível para as chamadas reservas last minute, o quadro mudou e, atualmente, a antecipação é regra no que respeita ao planeamento dos períodos de pausa. Os portugueses estão a comprar viagens cada vez mais cedo, tendência comprovada na corrida às férias de verão que começou ainda nos meses finais de 2023.

Este movimento acabou por originar um arrefecimento das vendas dos operadores no segundo trimestre do ano que, nalguns casos, tiveram de se socorrer de campanhas de baixa de preços para estimular o dinamismo.

O presidente da APAVT admite não esperar “crescimentos agressivos no mercado, mas sim consolidação de um grande ano” e quase às portas de 2025 o balanço é já límpido. “No geral, foi um grande ano, sobretudo considerando estes resultados em cima dos recordes que já tínhamos registado em 2023. Esperávamos acompanhar os números do setor do turismo e assim está a acontecer”, repara.

A passagem de ano é a última linha do calendário de um 2024 de recordes e, à semelhança do que foram os últimos meses, as perspetivas apontam para um virar de ano com chave de ouro.

“À data de hoje, as reservas estão francamente acima do ano passado. As operações que estão desenhadas para o final do ano estão a ser vendidas a muito bom ritmo e bastante acima de anos anteriores. A oferta no final do ano não vai crescer muito mais, vamos, sim, ter as operações preenchidas mais cedo o que do ponto de vista da rentabilidade é uma excelente notícia, porque quando as operações estão preenchidas mais cedo, não precisam de ser estimuladas com ofertas especiais e, portanto, a margem da operação não cai”, explica.

Pedro Costa Ferreira justifica a repetição deste padrão de antecipação com o facto de os consumidores saberem “muito bem o que querem” e de terem consciência “de que os lugares podem acabar”. “Se há algum conselho que podemos dar aos consumidores é o de que se têm planos para o fim do ano comecem a olhar para as reservas porque, eventualmente, elas poderão esgotar”, alerta.

Fim de ano perto de esgotar

Na hora de fazer planos para entrar no próximo ano, são vários os destinos que seduzem os portugueses. A liderar, está o Brasil que continua a reunir as preferências nesta época. Seguem-se o México, Punta Cana e Cabo Verde, ou, num contexto mais citadino, Nova Iorque, Londres e Berlim. Mas há outros destinos, menos habituais para esta altura, que estão a ganhar força como o Dubai , as Maldivas, a Lapónia ou a Tailândia. Por cá, A Madeira, os Açores e o Algarve são a eleição dos que querem passar estes dias dentro de portas.

A dois meses do final de 2024, as agências admitem o elevado número de vendas fechadas nesta altura, em comparação com 2023.

“O fim de ano está muito bem composto, já está em níveis de ocupação já extremamente elevados. Nunca vendemos tão cedo. Foi um ano sem memória, não me recordo de nenhum movimento idêntico. E agora no fim de ano também está a existir esta tendência porque as pessoas percebem que quanto mais cedo reservarem mais hipóteses têm de encontrar produtos mais acessíveis e escolherem o que realmente querem”, partilha o diretor-geral da Solférias, Nuno Mateus. Também a agência Abreu confirma que “as vendas para a temporada de fim de ano se apresentam um pouco mais fortes”.

Para a Top Atlântico o fim-de-ano é sinónimo de vendas para um mercado premium. “É uma época em que os portugueses concorrem com turistas estrangeiros com maior poder de compra pelos mesmos lugares, por exemplo no Brasil, e o número de lugares disponíveis para o mercado faz com que o preço dos destinos mais pretendidos, não seja para as massas. Não sentimos um crescimento relevante no número de viajantes para este período, mas sentimos um acréscimo de qualidade e valor das reservas realizadas”, contrapõe Margarida Blattmann.

A responsável da agência de viagens explica que a importância da antecipação nas reservas é agora maior e garante que a procura em cima da hora não é boa ideia este ano, sob pena de não existirem lugares disponíveis, mesmo nos pacotes com preços mais elevados.

“Um exemplo no segmento premium é o fim de ano no icónico Copacabana Palace [no Rio de Janeiro, Brasil]: um programa que pode custar quatro mil euros por noite e está já esgotado. É algo procurado por turistas de todo o mundo”, exemplifica.

Operação no Porto cresce

Os constrangimentos no aeroporto da Portela continuam a ser uma das maiores pedras no sapato na operação das agências de viagens. Com a capacidade estrangulada e sem margem de crescimento é para o aeroporto Francisco Sá Carneiro que os charters têm vindo a ser desviados, solução que tem vindo a ganhar força nos últimos anos.

“Esta tendência acentuou-se este ano sobretudo para novos slots. É praticamente impossível criar novas operações à partida de Lisboa e portanto, sobretudo nas operações de médio ou longo curso estão a ser criadas à partida do Porto e a minha previsão é que se venha acentuar”, enquadra Pedro Costa Ferreira.

O presidente da APAVT antecipa mais desafios na operação no aeroporto Humberto Delgado resultantes das obras de melhoria que a ANA irá realizar já a partir de novembro.

“Todos temos consciência de que será mais um problema para os próximos anos. Antes de ficar melhor, e todos esperamos que fique um bocadinho melhor, vai certamente ficar pior e nenhum de nós consegue imaginar quais poderão ser as condições do aeroporto ficando pior do que já está”, antecipa.

Já sobre a proposta do Orçamento do Estado para 2025, o presidente da APAVT diz-se “satisfeito” pela “aparente aprovação” do documento que permitirá, defende, criar uma estabilidade política. Quanto às propostas, assume que gostaria ter visto inscrita uma “maior descida de impostos”, mas rejeita que fossem necessárias medidas específicas para o setor do turismo.

“O turismo tem crescido mais do que a economia e não é por ter o apoio de nenhum Governo, atual ou anterior. O turismo cresce mais porque é mais competitivo internacionalmente do que a média da economia portuguesa. As empresas precisam é que as deixem processar esse crescimento e nos deixem competir sem problemas acrescidos relacionados com política interna”.

“É evidente que a carga fiscal nos parece muito alta, quer para as empresas quer para as pessoas, julgo que será mais difícil ao país crescer com esta carga fiscal e pensamos que a tónica de toda a política económica nacional deve ser o crescimento”, defende.

Fonte: Diário de Notícias / Portugal

Crédito da imagem Carlos Vidigal