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Finanças. Um Orçamento que quer pôr o país a crescer, mas tem “pouca margem” para errar e negociar

O salão nobre do Ministério das Finanças, em Lisboa, é bastante amplo, mas esta quinta-feira foi pequeno para tanta gente que foi acompanhar, ao vivo, a apresentação da proposta de Orçamento do Estado para 2025 (OE 2025).

Na sala repleta de altos responsáveis e muitos outros trabalhadores das Finanças, mais um grupo sólido de jornalistas, muitos sentados, outros de pé (os da TV, com auriculares), receberam com nitidez a mensagem do ministro das Finanças (também ele de pé, num palco), Joaquim Miranda Sarmento: uma proposta orçamental que, diz, vai ajudar o país a crescer mais e melhor.

Um programa que alivia impostos, sobe salários públicos e pensões, e aposta (agora é que é) na descolagem do investimento, contando com um impulso notável do investimento público alicerçado nos preciosos fundos europeus e, em especial, num Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) a entrar em velocidade de cruzeiro no ano que vem.

Do novo OE sabe-se que o saldo das contas públicas no final deste ano vai ser ligeiramente superior ao que o governo previa em abril, no Programa de Estabilidade, com o Ministério das Finanças a estimar um excedente equivalente a 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB), uma décima mais do que há seis meses.

No ano que vem, o excedente alivia um pouco, para 0,3% do PIB, de acordo com o documento oficial, que agora vai ser debatido, escalpelizado e votado no Parlamento. Primeiro teste de fogo: votação final na generalidade, a 31 de outubro próximo.

Num ano em que se perfila uma série de medidas de redução de impostos, como é o caso do IRC e do IRS Jovem, o Executivo PSD-CDS promete, nesta proposta orçamental, um alívio ligeiro da carga fiscal pura (só impostos, receita fiscal) de 25% do PIB este ano para 24,7% no próximo.

O governo e a tutela de Miranda Sarmento praticamente não se desviam da rota plurianual de consolidação orçamental que tinha sido prometida à Comissão Europeia (CE) no referido Programa de Estabilidade. Também aí, o excedente projetado para 2025 era 0,3%.

Aqui, insistiu o ministro, há pouca margem para errar e o que tiver cabimento negocial com (os partidos da oposição, estaria ainda a pensar no PS) poderá ser integrado, desde que deixe intacta esta meta, que vai ser enviada hoje, sexta-feira, para Bruxelas.

Este OE é o primeiro pilar do primeiro ano do plano orçamental-estrutural nacional de médio prazo, que deve definir a trajetória de disciplina financeira e de redução da dívida até 2028.

A despesa total (sem contar com fundos europeus e PRR) deve cair de 43% do PIB em 2024 para 42,5% em 2025, sendo de notar duas situações distintas.

Por força das medidas de promoção e reposição salariais que o governo tem vindo a implementar, mais algumas contratações, a despesa total com pessoal sobe de 10,8% para 10,9% do PIB em 2025.

Já os apoios sociais, que em parte refletem o estado da economia e o mercado de trabalho, devem perder peso na conta global, passando de 18,3% para 18,1% do PIB no ano que vem, indicam os quadros finais do OE 2025.

Pequeno brilharete

O pequeno “brilharete” de Miranda Sarmento em 2024 é parcialmente explicado pelo melhor comportamento da economia do que se esperava em abril.

Há seis meses, o Governo previa uma expansão real este ano de 1,5%, mas afinal deve ser mais. A nova proposta de OE 2025 diz 1,8%. A inflação prevista alivia, a taxa de desemprego estabiliza, embora a criação de emprego perca bastante gás.

O peso da dívida também desce, como seria de esperar: o rácio do endividamento público deve terminar o corrente ano nos 95,9% do PIB, descendo para 93,3% no final do ano que vem.

Em 2025, a nova projeção das Finanças espera que a economia cresça 2,1% em termos reais quando em abril dizia 1,9%.

Ou seja, o novo OE irá ser executado, assim espera o Governo, numa economia em aceleração ligeira e em que as famílias podem ganhar algum poder de compra, o combustível do consumo privado.

Assim é porque, prevê o governo, a inflação deve aliviar em toda a linha ao longo de 2025. O índice de preços harmonizado (inflação no consumidor comparável com os restantes parceiros europeus) deve aliviar de 2,6% este ano para 2,3% no próximo.

A taxa de desemprego deve terminar este ano nos 6,6% da população ativa e descer uma décima em 2025 para 6,5%.

A criação de emprego é que deve abrandar de forma notória. Depois de um aumento de 1,1% este ano, o número de postos de trabalho existentes na economia só deve aumentar 0,7% no ano que vem, diz a nova projeção das Finanças.

Ainda no quadro macroeconómico, o governo espera uma aceleração das exportações totais, de um ritmo de 2,5% este ano para 3,5% no próximo. As importações acompanham com uma evolução em tudo similar.

O consumo privado (das famílias) também ganha gás, crescendo 1,8% em 2024 e 2,1% em 2025.

O investimento total (contando com privados), uma das variáveis mais decisivas para o crescimento futuro, mantém o passo: cresce 3,2% este ano e 3,5% no próximo.

Governo admite dar mais “caso haja margem”

Como referido, o excedente deste ano, em contas nacionais, as que valem para o Pacto de Estabilidade e a Comissão Europeia (CE), vai ser maior do que se esperava há seis meses — mais 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB), quase 280 milhões de euros, segundo contas do DN, a partir da proposta de Orçamento.

Questionado pelo DN sobre como é que esse resultado maior do que o esperado pode ser usado, se podia de alguma forma transitar ou refletir-se em parte no exercício do próximo anos, facilitando o ponto de partida para o novo OE 2025, Miranda Sarmento respondeu que “os saldos orçamentais não transitam de um ano para outro”, que o resultado “é para ser usado na redução da dívida pública”.

Para pagar aos credores internacionais e nacionais, como bancos e fundos, e aos credores oficiais, como os mecanismos europeus de resgate e à União Europeia, basicamente.

Para mais, “o país não está neste momento em condições de ter excedentes orçamentais muito elevados do ponto de vista dos serviços públicos ou da carga fiscal ou da execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), defendeu o ministro.

Relativamente ao próximo ano, há uma margem orçamental, uma folga, que pode ser usada, mas que desde 4 de outubro, quando o primeiro-ministro, Luís Montenegro, apresentou a contra-proposta quando ainda decorria conversas com o PS, pode ter ficado, entretanto, mais curta em 2025, fruto de medidas que foram vertidas para fechar esta proposta de OE. No início do mês, a folga ainda não usada era de 1000 milhões de euros, disse o chefe do governo.

Excedente tem de ficar intacto apesar de novas negociações

Sarmento acrescentou que, seja como for, “se o Orçamento for viabilizado [primeira votação acontece a 31 de outubro], contamos que os partidos sejam responsáveis” no sentido de manter o excedente previsto em 2025, que o governo prevê em 0,3%.

Se as propostas que vierem a lume respeitarem este valor, “há margem para aceitar”, sendo certo que o fundamental é cumprirmos as regras europeias e reduzir a dívida pública”.

E mais. Também questionado pelo DN sobre a consistência deste OE 2025 como primeira grande etapa do ajustamento estrutural que a Comissão Europeia e a Europa vão pedir aos países (Portugal não é exceção) nos próximos quatro ou cinco anos, o ministro explicou que o OE (a meta de saldo final de 0,3% do PIB, incluída) “está totalmente alinhado com as metas estruturais de médio prazo”.

Portanto, qualquer mexida que altere o excedente de 0,3% (reduzindo-o) terá de ser imediatamente compensada, sobretudo se ocorrer do lado da receita. Descidas maiores na carga fiscal terão de ser logo compensadas por reduções equivalentes nas despesas públicas.

Ato contínuo, o ministro apelou aos partidos da oposição para que sejam “responsáveis na viabilização do OE na generalidade e responsáveis na discussão e votação na especialidade”. Isto para que o país possa ter condições para continuar a reduzir a dívida publica. “É muito importante para o país que este orçamento seja aprovado”, sublinhou.

Numa ‘bicada’ a Pedro Nuno Santos, Miranda Sarmento recordou que – em ocasiões anteriores – o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, declarou-se “completamente comprometido com o saldo orçamental do governo para este ano” [o referido excedente de 0,3%]. Ou seja, o ministro procurou “encostar” o PS às grandes linhas inscritas no OE, pelo que considera que os socialistas ficaram, agora, sem razões para chumbar o documento.

Pensões podem ter novo aumento

O Governo prevê, caso tenha folga em 2025, dar um novo suplemento aos pensionistas, tal como já fez este ano. Mas o ministro das Finanças sublinhou a questão da folga orçamental para o fazer, algo que só poderá calcular daqui a nove meses.

“Podemos fazer um novo aumento suplementar nas pensões. Se, a meio da execução orçamental, tudo estiver a correr melhor do que projetámos para 2025, e cheguemos a um valor que permita um equilíbrio orçamental, então faremos tal como este ano. Mas só para julho ou agosto teremos dados para saber isso”, disse Sarmento.

Nos apoios à habitação, o ministro das Finanças foi questionado sobre se as medidas temporárias aprovadas, que incluem por exemplo a isenção de comissões, se vão manter ou não.

Referiu ainda que tais medidas não são alteradas pelo OE, mas sim por decreto que o Governo pode aprovar. E revelou que o Executivo está a avaliar e tomará uma decisão até ao final do ano.

Fonte: Diário de Notícias / Portugal

Crédito da imagem: Paulo Spranger