O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, avisou esta quinta-feira, 05 de outubro, em Lisboa, que as instituições internacionais e portuguesas ou “mudam a bem ou mudarão a mal”, ou seja, “tarde e atabalhoadamente”.
No discurso na Praça do Município, na capital portuguesa, local da cerimónia comemorativa do 5 de Outubro (data que, em 1910, ocorreu a implantação da República) teve a presença, entre outros, do primeiro-ministro, António Costa, e do presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva – Marcelo Rebelo de Sousa aludiu “à guerra global feita de muitas outras guerras” e alertou para os tantos que insistem “em não ver que a balança de poderes do mundo está em mudança”.
“E ou as instituições internacionais ou domésticas mudam a bem ou mudarão a mal. E mal porque tarde e atabalhoadamente”, avisou.
Na análise do Presidente da República isto poderá acontecer se houver atrasos com o clima, a energia, a inteligência artificial ou em relação ao “peso das comunidades” como as Nações Unidas, União Europeia, CPLP, NATO ou mundo ibero-americano.
“Tudo isso poderá suceder com a incapacidade ou a lentidão do superar da pobreza e das desigualdades sociais, ou no reconhecimento do papel da mulher, ou do papel das minorias migrantes e em particular dos jovens”, alertou.
Num discurso com 11 minutos de duração, Marcelo Rebelo de Sousa começou com uma reflexão de “como eram diferentes o mundo, a Europa e Portugal há 100 anos”, quando tinham passado apenas 13 sobre a proclamação da República, numa altura em que “o tempo parecia lento, especialmente nos espaços rurais” e “o dia a dia era a agricultura, salvo em centros industriais escassos”.
Nessa altura, recordou o Presidente da República, na Europa e no mundo “ainda mandavam os do passado”, quando se acreditava que “o liberalismo parlamentar de minorias era como que o fim da história”.
Nos anos 20, a Europa vivia “convencida de que sempre dominaria o universo”, numa época em que esse mundo, essa Europa e esse Portugal estavam, sem o saberem nas antevésperas do começo, do começo, do começo do seu fim”.
“Olhamos para o que era o mundo, a Europa e Portugal há precisamente 100 anos e há realidades que vistas a mais distância nos impressionam”, referiu, recordando as dificuldades para a maioria no acesso à educação, à informação e ao conhecimento que “na altura era acessível a privilegiados”.
Marcelo Rebelo de Sousa ainda defendeu que é possível ter “democracias mais fortes” caso não se opte por “esperar para ver”, pedindo reformas “a sério” para evitar mudanças vindas dos pântanos e “revolver águas paradas”.
“A mudança chegar porque se prefere a antecipação ao conformismo, a abertura ao fechamento, a alteração das mentalidades, das instituições e das práticas ao situacionismo e à inércia. Só depende de nós. Nós, responsáveis a todos os níveis, nós povos, nós cidadãos de Portugal, da Europa e do mundo”.
Exortando a que não se deixe “morrer essa liberdade” em que vivemos, “incluindo a liberdade de pensamento e de expressão, custe o que custar”, Marcelo Rebelo de Sousa foi perentório: “Podemos fazer democracias mais fortes se não nos contentarmos em esperar para ver”.
“Podemos fazer organizações universais mais fortes se não nos habituarmos a prometer ano após ano a sua reforma, sabendo que não vamos cumprir. Podemos reformar a sério, prosseguir o caminho das reformas, para não termos de ver contrarreformas fazerem ou pretenderem fazer aquilo que fizemos de conta que não importava assumir”, defendeu.
No entanto, para o Presidente da República caso as instituições e os sistemas demorem “eternidades a compreender que devem evoluir e reformar-se, reaproximar-se dos povos e desse modo não deixarem espaço para que outros preencham o vazio que vão deixando atrás de si”, há um risco evidente.
“Tudo isto poderá suceder e mais depressa do que se pensa: a mudança submergir pântanos, revolver águas paradas, abrir comportas demasiado tempo encerradas”, alertou.
Costa salienta “reflexão interessante” do PR sobre antecipar questões “para tomar boas decisões”
O primeiro-ministro considerou esta quinta-feira que o discurso do Presidente da República nas comemorações do 05 de Outubro – data em que se comemora a implantação da República, ocorrida em 1910 – foi uma “reflexão interessante” do chefe de Estado para alertar que “é preciso antecipar as questões para tomar boas decisões”.
“O discurso do senhor Presidente da República foi uma reflexão particularmente interessante para aquele alerta que todos temos que estar, que é preciso antecipar as questões para tomar as boas decisões”, considerou o primeiro-ministro, António Costa, no final da cerimónia comemorativa do 113.º aniversário da Implantação da República, que decorreu na Praça do Município, em Lisboa.
Costa considerou este alerta “particularmente oportuno” uma vez que vai partir esta quinta-feira para Granada, Espanha, para a III reunião da Comunidade Política Europeia e para uma reunião informal do Conselho Europeu na sexta-feira.
“Onde vamos debater aquilo que vai ser o futuro da Europa de um ponto de vista estratégico?????? e onde há decisões fundamentais a tomar relativamente ao alargamento, é uma condição essencial para assegurar uma paz justa e duradoura na Ucrânia mas que implica, como também o senhor Presidente da República aqui disse, no caso concreto, que haja reformas na União Europeia para que este alargamento seja um caso de sucesso como têm sido todos os outros”, salientou.
O chefe do executivo lembrou que Portugal aderiu à União Europeia há relativamente pouco tempo, em 1986, e salientou a “extraordinária revolução” que o país teve desde essa data.
“E é aquilo que temos que garantir que todos os novos estados-membros, seja a Ucrânia, sejam os países dos Balcãs Ocidentais possam fazer também esse percurso e para isso é necessário que a União se prepare para isso”, sublinhou.
Moedas alerta que divórcio entre política e pessoas dá espaço a radicalismos
O presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, alertou esta quinta-feira que o divórcio entre a política e as pessoas pode criar um vazio “capturado pelas minorias barulhentas e os ativismos radicais” que podem levar ao fim do atual regime.
“É este o atual divórcio que todos sentem entre a política e as pessoas. A política tem que voltar a ser vista, sentida e vivida pelas pessoas. Mas entre este mundo imaginário e o mundo real das pessoas, o que é que há? Há um vazio, capturado pelas minorias barulhentas e os ativismos radicais. À falta de um ativismo social moderado que dê respostas concretas, é a estes que as pessoas se agarram”, disse o autarca, anfitrião das cerimónias oficiais do 05 de Outubro.
O autarca considerou que os políticos, como atores sociais, têm a “responsabilidade ética, moral e social de não deixar que os portugueses se habituem a discursos políticos inconsequentes”, que “parece que falam de um país imaginário onde não vivem as pessoas reais”.
Moedas lembrou que “a República de 1910 autodestruiu-se também por causa dessas minorias barulhentas e desses radicalismos” e, por isso, o 5 de Outubro é “também uma lição histórica”.
“Quem fomenta esses radicalismos arrisca-se a colher, mais cedo ou mais tarde, a dissolução do regime. Não queiramos nós hoje, que caminhamos para os 50 anos do 25 de Abril, contribuir para um desfecho assim”, apelou, perante vários responsáveis políticos.
Durante o discurso, enquanto Moedas dizia que “hoje cabe aos políticos não se fecharem no mundo irreal, mas abrirem-se à realidade”, cerca de uma centena de pessoas que pretendia assistir à cerimónia ficou atrás das baias, colocadas a cerca de 150 metros do púlpito.
O autarca de Lisboa dirigiu-se ainda aos trabalhadores que fazem Portugal “todos os dias, com a sua dedicação”, muitos dos quais “pensam, com razão, que vivem sobrecarregados de impostos”, para lhes dizer que “é possível não trabalhar apenas para alimentar a máquina do Estado”.
“Sim, é possível diminuir os obstáculos à vossa vida. Todos temos de fazer este esforço: Estado central e autarquias”, afirmou.
Moedas acrescentou que, durante o seu mandato em Lisboa, a autarquia tem baixado os impostos.
“E para o ano baixaremos mais um ponto percentual, devolvendo aos lisboetas 4,5% do seu IRS. Gradualmente, mas com firmeza”, afirmou.
Fonte: Diário de Notícias / Portugal
Crédito da imagem: Tiago Petinga / LUSA